Relação da Viagem de Rouloux Baro ao País dos Tapuias

Escrito por Moreau, Pierre; Baro, Rouloux e publicado por Ed. Itatiaia. Ed. Universidade de São Paulo

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19 O modo de assar pelos selvagens do Brasil foi descrito por Jean de Léry, cap. 10, de sua obra América. Os americanos, diz ele, dispõem quatro forquilhas de madeira no chão, distantes num quadrado de cerca de três pés, com uma altura de dois e meio pés; colocam sobre as mesmas bastões atravessados a dois dedos um do outro, e chamam esta grelha de espeto. Põem as postas de carne em cima, preparam um pequeno fogo de madeira seca em baixo, que produz pouca fumaça, e viram-na freqüentemente, fazendo que cozinhem bastante aquelas que querem guardar. Assim procedem com os peixes e corpos humanos. Sua caça ordinária é de tapiruçús, que têm o pelo ruço, a figura e o tamanho entre a vaca e o asno, tendo a carne o gosto da de vaca. Os suaçús são uma espécie de cabras selvagens, das quais se fala aqui. Agouti (coati) é uma espécie de porco. Tapiti, de lebres; e assim outros. Acerca da gulodice insaciável dos tapuias, vide de Laet, liv. 15, das Índias Ocidentais, cap. 2,20. Há diversas espécies de abelhas e de mel no Brasil, ainda que Marcgrave, liv.7, dos Insetos, último capítulo, encare todas as abelhas deste país como semelhantes às nos sas, com a diferença de não terem ferrões. A este respeito, o Senhor de Laet, personagem muito curiosa, nota " seguido de Jacó Rabbi, que viveu longo tempo entre os tapuias e dedicou a relação que fez de suas viagens ao Conde João Maurício, " que há nestas regiões uma espécie de abelhas que os selvagens chamam Kitshaara, que se prendem aos pequenos arbustos, como as nossas aos grandes, nas colméias que fazem elas mesmas, semelhantes ao nosso papel grosso, nas quais envolvem seus favos, e nos quais se encontra mel mais que excelente. A segunda espécie é chamada por eles de Kitshagh e faz a sua obra nos cavos da terra. A terceira, cujos favos se encontram na terra, a modo de um pão de açúcar envolvido num papel grosso, é chamada heubig. Todas estas têm ferrões, como as nossas, e assim também aquelas cujo mel pende dos ramos das árvores, em forma de ninhos de pássaros, duro e preto, chamadas atshoí. A quinta espécie de abelhas, chamada ehenhne, não pica, trabalha nos ocos das árvores e formam grossos pelotões de cera e de mel; são tão firmes que é preciso rompê-los para servir-se deles. A sexta espécie, benatshí, não tem ferrões, trabalha nos ocos das árvores e formam grossos pelotões de cera e de mel; são tão firmes que é preciso rompê-los para servir-se deles.A sexta espécie, benatshí, não tem ferrões, trabalha como as nossas nos troncos das árvores e aberturas dos rochedos, produzindo o mel mais saboroso de todos. Os portugueses chamam todas estas espécies de mel de uma só forma, mel de pau, o qual misturado com água, tem o gosto do nosso vinho doce, refresca e alimenta. Ajuntando-se-lhe suco de pacobete, pacobuçu e jenipapo, obtém-se uma beberagem mais que excelente. Adicionando-lhe suco de fruta de ananás, ele embriaga e obriga a vomitar, e eu creio que esta é a beberagem que o nosso autor chama de uva e os brasilianos de nanai. Marcgrave, da Região dos brasilianos e dos Habitantes desta, cap. 7; Guilherme Piso, no liv. 4, das Faculdades dos Simples do Brasil, cap. 3, falando do mel selvagem, diz que ele é útil aos sãos e aos doentes. Que os brasilianos lhe chamam lira e que é encontrado nas grandes florestas e desertos. O nome das abelhas que fazem este mel é eiruba (herú). Piso nomeia doze espécies, e todas provocam vômitos, diz ele, quando colocadas em beberagem, por causa da sua doçura; desenraizam os humores viscosos do estômago e o confortam, removem a indigestão, expelem a urina e limpam as úlceras.20 Os chefes dos tapuias dão seus nomes às aldeias ou vilas em que comandam e são as suas moradas mais comuns, não tendo nenhuma permanente.21 (No texto cascabila). É necessário dizer cascavel, nome pelo qual os portugueses chamam a serpente denominada pelos brasilianos de boicininga, coicinininga, coitininga e coiquira, pelos tapuias oiugi, pelos holandeses Raetel Slange. Tem quatro a cinco pés de comprimento, é tão grossa no meio, como o braço de um homem próximo do cotovelo; suas escamas se implantam sobre a pele, que é colorida de um amarelo pálido, realçado pelo preto, e curtida por losangos que se aproximam uns dos outros; a fila de baixo entra ou junta-se mesmo na de cima. Sua cauda tem tantos nós quantos anos conta a serpente, produzindo, quando ela se move de rojo um ruído como o de campainhas; a natureza