Relação da Viagem de Rouloux Baro ao País dos Tapuias

Escrito por Moreau, Pierre; Baro, Rouloux e publicado por Ed. Itatiaia. Ed. Universidade de São Paulo

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13 Chamarei logo vossa atenção para o fato de que as casas particulares tanto dos oficiais holandeses, como de portugueses, construídas à margem dos rios, no campo ou nos caminhos, para facilitar o tráfego, retêm o nome daqueles que primeiramente as construíram ou daqueles que presentemente as habitam.14 É um parque de Claesen, que quer dizer Nicolas, segundo se interpreta a linguagem holandesa, que nutria as vacas e outros animais do país ou trazidos da Europa. Os nivernezes, chamam-nos vendas, que são terras arenosas e ingratas, não produzindo senão ervas e árvores acaçapadas, armadas de todos os lados de cercas vivas e de matas abatidas; têm apenas uma entrada, que serve também de saída feita em barricada. Os portugueses, assim como os holandeses, fazem de tais parques uso especial, aí alimentando suas vacas, ovelhas, carneiros, vendo-se até corços, que os selvagens chamam de suaçú; diversas espécies de javalis, uns tendo umbigo nas costas, chamados pelos naturais do país de taiaçú ? jaiguara; outros têm grandes orelhas agudas, sem seda nas costas, e o pelo ruço, (Marcgrave, em sua História dos Quadrúpedes, cap. 8). Há outros, chamados taiaguitas, isto é, javalis persistentes ou presos, porque esperam os homens nos caminhos e ao pé dás árvores, nas quais os índios se abrigam, a fim de evitar a sua fúria (De Laet, liv. 15 das índias Ocidentais, cap. 5). Há, ainda, outros animais, mencionados por Jean de Léry no 10° cap. de sua América.15 Este governo, ou capitania, é um dos principais do Brasil, situado entre o segundo e o quinto grau do Equador, da banda do meio-dia, entre os do Maranhão e Rio Grande, após o qual, em direção ao Trópico de Paraíba, Itamaracá, Pernambuco, Bahia, Ilhéus, Porto Seguro, Espírito Santo, Rio de Janeiro e São Vicente. A respeito da traição dos do Ceará da qual se falou aqui, é preciso saber que os holandeses, tendo tomado São Salvador, cidade que está na Baía de Todos os Santos, capital da Capitania da Bahia no mês de maio do ano de 1624, entregaram-na aos portugueses no mês de abril de 1625. Isto não impediu, absolutamente, que os holandeses voltassem ao Brasil, onde, no ano 1630 tomaram de improviso a cidade de Olinda, capital do governo de Pernambuco, ou Pernambuco, no começo do mês de maio. Depois fortificaram-se ao longo da costa, notadamente no Recife, que é uma povoação fundada no extremo de uma língua de terra, que se projeta no mar, cobrindo o porto. Os portugueses que escaparam em seus navios retiraram-se para a Europa, os outros fugiram para junto dos tapuias, seus aliados em terra firme, até que chegou a hora de se vingarem dos holandeses, seus inimigos. Os selvagens dos governos de Pernambuco, Itamaracá, Paraíba, Rio Grande, Siara ou Ceará seguiram o partido dos vitoriosos, excetuados alguns dos caciques que, apiedando-se dos portugueses fugitivos, secretamente os favorecem. No ano de 1646, aproveitando a ocasião de uma viagem que os tapuias do Rio Grande fizeram ao Ceará, com alguns holandeses, dirigidos por Jacó Rabbi, mataram-nos a todos, depois de, aparentemente, os terem recebido bem.16 Este forte está construído à esquerda do Rio Grande, do qual tomou o nome, chamando-se Rio Grande.17 Do dito forte até a morada de Janduí, há um caminho que foi feito outrora por um tenente-coronel holandês, chamado Garstman, e que conserva, ainda hoje, o seu nome.18 Cunhaú é uma povoação situada à beira-mar, no norte, entre as capitanias de Paraíba e Rio Grande, na baía dita pelos portugueses da Traição e pelos franceses Trahison, distante sete léguas da Paraíba. O rio é em parte arenoso, em parte lamacento, e o terreno é coberto de florestas; através delas, os portugueses, acompanhados pelos habitantes do país, chamados tiguares (petiguares), que habitam a vila ou aldeia de Tabuçurã, a quatro horas de caminho de Cunhaú, vieram ao dito burgo de Cunhaú, em 1646, e mataram os seus habitantes, assim como os holandeses que estavam com eles.