Relação da Viagem de Rouloux Baro ao País dos Tapuias

Escrito por Moreau, Pierre; Baro, Rouloux e publicado por Ed. Itatiaia. Ed. Universidade de São Paulo

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os quais, indignados pelo fato de eles não terem seguido o seu partido, tendo sido amigos anteriormente, procuravam sua perda; tinham-se aliado à gente de Camarão e aumentado sua armada de grandes e temíveis tropas, que estavam acampadas acima do Paraíba com Vvajapeba, que tinha estado sempre do seu lado e morara longo tempo entre eles na Várzea; eles é que lhe tinham enviado os presentes que me mostrara, da parte do referido Camarão. Que, eles todos se tinham juntado a Paiucu, de sorte que, não podendo resistir-lhes, estava resolvido, caso não fosse socorrido por mim e pelos meus homens, a retirar-se para o Rio Grande, próximo do nosso forte. Este discurso me sobressaltou, pois não tinha nenhuma vontade de vê-lo tão perto de mim. Eis porque lhe disse que não devia ele abandonar a sua terra e que ali devia esperar o inimigo, caso fosse verdadeiro que este estava pronto para atacar.Chegamos no dia seguinte perto da aldeia dos brasilianos, que estava situada na margem do Rio Potengi e no dia 15 mandamos pedir-lhes milho, favas e abóboras. Janduí fez-me assentar ao pé dele e interrogou-me porque, tendo-lhe eu prometido outrora dois cães, não os havia dado a Muroti, quando este me visitara no Rio Grande. Disse-lhe que não me lembrara e que Muroti também não havia tocado nesse assunto; senão eu teria escrito aos Nobres Poderosos que me permitissem tomar aqueles que eu tinha emprestado a Jacó * No texto, " Salmes" e "Upamene". O Major Mário Barreto deixou como está no original. Vide adiante nota 59 do Senhor Morisot.

Rabbi e estavam no Forte da Paraíba. Replicou-me que não tinha importância e que eu lhe deixasse os dois cães que me acompanhavam, até que lhe remetesse os outros dois, pois não podia dispensá-los. Disse-lhe que refletiria sobre isso antes de partir.A 16, pernoitamos na margem do Rio Potengi, todos molhados, tendo apanhado uma serpente chamada pelos portugueses de cobra-veado, de três braças de comprimento, a qual os selvagens puseram num fosso, onde antes tinham feito fogo, para aquecê-lo, depois cobriram-no de terra e esta de faxinas, às quais atearam fogo, a fim de assar a dita serpente. Os feiticeiros reuniram-se no morro vizinho e nós com eles: choveu abundantemente em torno deles e de nós, mas não sobre eles nem sobre nós.Na manhã do dia 17, tirou-se a serpente do fosso e dela comeram todos os principais, com exceção de Janduí e dos feiticeiros; acharam tanto o que comer nesta cobra como se tratasse de um grande porco do mato. Não beberam nada durante a refeição, segundo o seu costume; foi preciso ir à aldeia vizinha para aí tomar uma beberagem de milho, que acabara de ser feita. Aí os tapuias, suas mulheres e filhos carregaram-se de milho que encontraram em abundância; durante esse tempo, vieram avisai-nos da parte de Vvajupu que ele avançava em nossa direção, porque corria o rumor de que Paiucu se pusera em campo com suas tropas para atacar-nos. Ouvindo isto, Janduí ordenou a todos os brasilianos da aldeia que preparassem suas setas, flechas e arcos, enquanto esperavam o socorro dos holandeses, devendo ferir-se o combate logo que este chegasse. Permaneci na aldeia toda a noite, que os tapuias passaram dançando, não obstante aquela notícia.Como estivesse chovendo no dia 18 de junho, eu me distraía a examinar a minha choça, que era coberta de ramos de palmeiras, quando ali vi uma pedra preta transparente, parecida com aquelas que se encontram na Mina do Ministro Stetten: pedi a meus hóspedes que me arranjassem outras iguais. Eles trouxeram-nas imediatamente e eu guardei-as para apresentá-las aos Nobres Poderosos. Verificando que as mesmas me agradavam, trouxeram, à tarde, maior quantidade do que antes e ensinaram-me o lugar onde as apanhavam no morro grande.