Relação da Viagem de Rouloux Baro ao País dos Tapuias

Escrito por Moreau, Pierre; Baro, Rouloux e publicado por Ed. Itatiaia. Ed. Universidade de São Paulo

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se o soubesse, tê-los-ia feito massacrar a todos." Eu o adverti de que tivesse cuidado com eles, pois, indubitavelmente, o trairiam. Isto irritou-os e, olhando-me de soslaio, demonstraram sua ira e que, se me pudessem apanhar, se vingariam de mim. Imediatamente pediram licença a Janduí para retirar-se no dia seguinte.Assim fizeram, enquanto.os homens do rei corriam a árvore como antes. Cerca de meio-dia, dois tapuias de Preciaua vieram ter conosco, assegurando que Paicu e sua gente tinham feito um acordo com os inimigos, resolvidos a vir todos juntos guerrear contra Janduí. Este magoou-se, sentou-se no chão e, após um longo silêncio, disse-me: " "Vês, meu filho, o que se passa" Não queres socorrer-me contra teus inimigos e os meus" Tu me asseguravas há dias que tinhas tanto poder e comando sobre os teus, quanto tivera Jacó Rabbi, e que podias levantar tantos holandeses e brasilianos quantos quisesses. Eis o momento de prová-lo, visto que os nossos inimigos estão muito mais fortes do que eu."Respondi-lhe nestes termos " "É preciso, primeiramente, meu pai, que te informes se a notícia que vem de lhe ser dada é verdadeira e, se for, que reúnas tantos tapuias quantos puderes. Por mim, irei à minha morada e te trarei dos meus tudo o que puder conseguir para o teu socorro; mas creio que o que te disseram é inventado; e o tempo irá demonstrar isso."No dia 8, continuou-se a correr a árvore. Entrementes, chegaram brasilianos, dos que habitam as margens do Rio Potengi, conduzidos por dois de seus chefes, Vviauvug e Hipaí, que presentearam o velho com milho, ervilhas e favas, e depois acusaram um certo Diego, brasiliano, do assassinato de outro brasiliano chamado Carajá, pedindo justiça, a qual lhe foi negada por Janduí, dizendo-lhes que era preciso viver em paz uns com os outros e só combater os inimigos; que era despropositado matar os seus, quando se estava em perigo, e ele era mais fraco do que os que vinham atacá-lo, pois aquele que eles acusavam poderia matar dois ou três inimigos. Depois, voltando-se para mim, fez-me prometer-lhe que mandaria João Straffi, no dia seguinte, ao Rio Grande, a fim de ir buscar meus homens em seu socorro.* Talvez seja feijão. Mário Barreto traduziu como legumes (L. B. R.)No dia 9, foi-se à caça para alimentar os recém-chegados, que me pediram um salvo-conduto para um de seus chefes, um brasiliano chamado Baltazar Tamaris, que desejava morar com eles, o que fiz, ressalvada a aprovação dos Nobres Poderosos, mais para agradar os tapuias do que por outra qualquer razão. Durante toda a noite, aquele povo nada mais fez senão discorrer sobre a maneira pela qual avançariam contra o inimigo e o atacariam, não querendo admitir que este lhes tomasse a dianteira.Enviei João Straffi na manhã seguinte ao Rio Grande para reunir os meus homens e nós continuamos a marchar junto do grande morro onde achamos mel e ratos em abundância; e tendo morrido um tapuia nesse dia, os outros o comeram. No dia 11, os jovens puseram-se a dançar, para acabar o luto de um de seus principais que tinha falecido.No dia seguinte, os feiticeiros chegaram junto de nós e reduziram a pó certas sementes de corpamba, que tinham torrado numa panela; depois de misturá-las com água, engoliram-nas. Imediatamente essa beberagem saiu-lhes pelo nariz e pela boca e eles se agitaram como possessos. Disseram-me que celebravam esta cerimônia a fim de que o seu milho, ervilhas e favas pudessem amadurecer bem depressa. Os que tinham ido à caça trouxeram um porco da raça miúda chamada taietetu. A chuva durou todo o dia.A 13 do referido mês, enquanto os tapuias estavam na caça, Janduí, conversando comigo, disse-me que sempre servira aos holandeses em suas necessidades; que pedia retribuição contra aqueles que haviam matado os de minha nação em Salinas e em Ipanema* ,