Memorável Viagem Marítima e Terrestre ao Brasil

Escrito por Nieuhof, Joan e publicado por Livraria Martins

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O calor, aí, é terrível e a grande escassez de água potável - pois que se não pode contar com a das chuvas, alterada pelo ardor dos raios solares - constitui a causa principal do escorbuto.

Passamos a linha Equinocial.

Cerca de três anos após a minha chegada ao Brasil encontrou-se um navio português vagando à mercê das ondas, na linha equinocial, sem nenhum ser vivo em seu bojo. O diário de bordo dizia que seis semanas antes o barco se havia imobilizado sob o Equador.

Fizemos uma excelente travessia, com pescaria abundante, tendo, então, conhecido um peixe soprado porque aspira apreciável quantidade de água para em seguida expeli-la de um jato. Costuma acompanhar as embarcações por muito tempo.

No dia 8 passávamos pela Ilha Fernando de Noronha, com tempo magnífico. Avistamos grande quantidade de pássaros e enormes cardumes de peixes voadores, seguidos de perto pelos Bonito e Koret.

A Ilha Fernando

A Ilha Fernando de Noronha, situada a 4 graus de latitude sul e cerca de cinqüenta milhas da costa do Brasil, foi habitada pelos holandeses, por volta de 1630, mas, devido à grande quantidade de ratos que devastou todas as plantações, fora abandonada pelos batavos alguns anos depois 1. A não ser isso é uma ilha ferocíssima e o mar em torno dela é tão piscoso que os habitantes do Recife costumam ir lá pescar, voltando com os barcos abarrotados de peixe.

Pouco tempo depois o Conselho do Brasil despachou para lá uma leva de negros sob as ordens de um tal Gillis Venant 2, com o objetivo de cultivar a terra para sua subsistência; e, assim, lá viveram os pretos algum tempo. Ano e meio depois o Conselho de Justiça desterrava para aquela ilha diversos malfeitores que também receberam petrechos com que cultivar a terra e prover seu sustento.

Na noite de 11 estávamos a 7 graus, ao largo de Goiana, situada cerca de 20 milhas ao lado de Olinda. Ao romper do dia avistamos o litoral brasileiro, mas permanecemos ao largo até que se adiantasse o dia.

No dia 12, como estivesse muito densa a cerração, mantivemos o mesmo rumo ao longo da costa, e, com bastante vento, pelo meio-dia, che


  1. Nota 10: A quantidade de ratos devastando as plantações é confirmada por outros autores. Assim, Wätjen (XCVI, p. 128), baseando-se em uma carta de Willem Joosten Glimer a Van Keulen e Gijsselingh a 9 de fevereiro e a 26 de março de 1634, falamos de que "uma terrível praga de ratos aniquilou quase todas as culturas". Ayres de Cazal (XXVI, 194) declara, também, que os "ratos são numerosíssimos". Cf., também, Branner, (XIV, 142).

  2. Nota 11: O objetivo era o cultivo do anil. Gillis Venant recebeu 23.000 florins para esse fim. Em junho de 1644, mandou plantar exemplares que obtivera nas Índias Ocidentais. Wätjen (XCVI,442).