cessam pelo remédio aplicado. A matéria muito acre, retida, inflamada pelo excessivo calor e pela esquálida e sórdida sujidade do corpo desenvolvida internamente, adquire grande grau de putrescencia, com tão atroz dor e inflamação que logo carcome o músculo esfíncter e o orifício das veias hemorroidais. Daí nasce um fluxo cruento, que sobe mais fundo até as túnicas dos intestinos, de tão disforme aspecto que o ânus aparece largamente aberto, à semelhança de uma cloaca, com uma cor lívida e plúmbea. Às vezes este mal se manifesta por si, isto é, com dor, retenção dos excrementos, os quais, secos e endurecidos pelo calor, são evacuados não sem grandíssima dificuldade e dor. Algumas vezes, ainda que com grande esforço, nada em absoluto se expele (como eu mesmo também experimentei), ficando o ânus muito proeminente. Freqüentemente das fezes retidas são provocadas dores atrozes; seguem-se-lhes depois febres, lassidões, insônias, perturbações do estômago, principalmente dores e ardores na cabeça. Por isso, antes que o mal se espalhe (e fá-lo rápido), resista-se-lhe com remédios internos, laxantes e refrigerantes. Apliquem-se, uma e mais vezes, clisteres deste mesmo gênero, devendo insistir-se sempre com supositórios, fomentações, lavagens, banhos, fumigações. Principalmente não se negligenciem as venessecções. Se, por todos estes meios, a doença em breve não ceder, degenerará sem dúvida em letal. Muitas vezes costuma acontecer também que, sem nenhuma doença intestinal ou qualquer outro sinal precedente, se insinue, às escondidas, um seminário de germes numa parte menos sensível, e a princípio se oculte ao próprio doente e ao médico. E assim, o mal é tido por incurável, porque não raro acarreta a gangrena. Uma vez declarado, costuma apresentar os seguintes sintomas: cansaço espontâneo, dores de cabeça e dos membros, falta de apetite, temperatura quente de todo o corpo, insônias, pulsação das veias desigual e acelerada, sem dor manifesta do ânus, a não ser com algum prurido ou vão desejo de exonerar o ventre. Por isso, em toda moléstia intestinal os médicos costumam inquirir sobre o estado do ânus. Não contentes com isto, os empíricos nativos exploram o ânus com a vista e o tato, a fim de ver se aparece algo fora do natural. A seguir, sondam
Historia Natural Médica da Índia Ocidental
Escrito por Piso, Guilherme e publicado por Ed. Itatiaia. Ed. Universidade de São Paulo