Historia Natural Médica da Índia Ocidental

Escrito por Piso, Guilherme e publicado por Ed. Itatiaia. Ed. Universidade de São Paulo

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ticos, que amiúde erram em bandos nas florestas. Há pouco foram trazidos pelos europeus rebanhos de gados, sobretudo bois, porcos e carneiros, que por toda parte, dão crias duas e três vezes por ano. Entre estes, os que ainda mamam excelem pela delicadeza da carne, a ponto de serem incluídos na dieta dos doentes, sendo muito preferíveis à carne de ovelha. Pela experiência consta que muitos quadrúpedes, peixes e aves, que vivem em sítios pantanosos e palustres, não por isso devem ser tidos em menos preço que os monteses e fluviais, como de ordinário acontece no norte da Europa, porque nestas regiões cálidas a excelente temperatura e serenidade do ar parecem ter a função de corretivo no tangente a natureza dos animais desta espécie.De nenhum modo faltam aves silvestres de ótimo paladar, as quais vivem parte nos bosques, parte nas águas. Embora não seja do meu intuito expô-las miudamente, não quero contudo omitir as que favorecem o apetite e a saúde, como as que vivem nas regiões montanhosas: faisões, perdizes, aves de rapina de várias espécies, de carne ótima e muito delicada. Ajuntem-se-lhes os papagaios, as codornizes, as rolas, os pombos, os tordos, os tendilhões, as pombas silvestres; todos de ordinário servidos assados. Dos anfíbios, famosos são os patos e adens de várias espécies; algumas superiores às européias em qualidade e tamanho, e outras inferiores.Demais, entre tantos gêneros de voláteis ribeirinhos e litorâneos (posto que tenham alguns a carne menos tenra), não devem omitir-se as garças estreladas e não estreladas, as galinholas, os frangos-d?água e semelhantes. Acrescentem-se-lhes os avestruzes, principais ladrões do âmbar gris.1 Este valioso gênero de betume, denominado âmbar, célebre em todas as Índias, sobretudo para restaurar os espíritos vitais, copiosamente lançado dos ignotos abismos do oceano às costas do Brasil, só aparece com mar tempestuoso. Donde sucede que, mal cessa a tempestade, as aves e alguns animais quadrúpedes, na mesma praia o devorem à porfia, antes que lá cheguem os habitantes do litoral. E é extraordinário que todo o âmbar antes de enxugar ao sol, é somente um glúten mole e de cheiro tão desagradável que fere as narinas e mete nojo a quem não


  1. Nota 45: Sobre o âmbar gris, sua história, propriedades, etc, veja-se a edição de Garcia da Orta, com os comentários do naturalista português, Conde de Ficalho, v. I,. 45-58. Lisboa, Imprensa Nacional, 1891.