História dos feitos praticados no Brasil, durante oito anos sob o governo do ilustríssimo Conde João Maurício de Nassau.

Escrito por Barleus, Gaspar e publicado por Fundação de Cultura do Recife

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súditos. Ainda agora erram pelas cercanias da Várzea e de Muribeca, e com dificuldade se podem apanhar, pois seguem de dia caminhos ocultos e de noite os mais conhecidos. Tem um só intento: extorquirem dinheiro aos senhores de engenhos, saquearem quanto encontram e despojarem das armas os nossos soldados vagueantes. Asseveram, porém, ser-lhes vedado incendiar os canaviais e fazer devastações. Também rodam por toda a parte, não sujeitos a nenhum laço de fidelidade ao rei e sem soldo dele, salteadores negros e mulatos, que causam aos habitantes do campo grandes, danos, conhecendo esconderijos e sabendo escapulir-se.

Recenseamento das naus.

Os registros dão os nomes de nossas naus grandes e pequenas contidas nos portos, baías e costas do Brasil, assim como o número dos tripulantes.Para serem duradouras e segurança do Brasil, a utilidade da Companhia e a honra da República, far-se-ia mister mandarem-se, sem demora, naus e marinheiros, armas e mantimentos, soldados e roupas. Tudo isso é preciso para se firmarem as possessões. Nada temos, carecemos de tudo, e sem tais adminículos não se pode esperar vitória nem na terra, nem do mar. Inermes, somos tímidos; armados, somos assaz audazes.A escrituração informa qual o dinheiro devido e quanto se despendeu com os oficiais e empregados [^nota-211].Esperamos a safra deste ano muito mais copiosa que a do passado.

Reclamação sobre o mau aparelhamento do navios

Vou inserir nas minhas reclamações mais esta: muitas naus avariadas e desconjuntadas, já não suportam o mar; as que mandastes, apenas chegaram, requeriam abastecimento, o qual deveriam levar mais farto as recentemente despachadas da Holanda; outras, por falta de tripulantes, tiveram necessidade dos nossos soldados para os trabalhos náuticos.

Soldados mal vestidos.

Ainda não disse tudo: os soldados andam mal vestidos, cobrindo apenas a desnudez. Conquanto não nos causem horror, e não os desejemos ungidos de perfumes, todavia os quiséramos vestidos mais decentemente, porquanto eles ganham coragem não só com armas adequadas, mas também com o trato e alinho do corpo. Portanto seria do decoro e interesse da Companhia que ela própria desse com largueza roupas e confortos desta espécie, porque, não sem lucro, seria fácil descontar nos soldos os preços respectivos. E não consentiriam isto de mau grado os filhos de Marte, porque, recebendo integral e constantemente a sua paga, não saberiam haver-se com tamanha ventura e gastariam, sem proveito,