História dos feitos praticados no Brasil, durante oito anos sob o governo do ilustríssimo Conde João Maurício de Nassau.

Escrito por Barleus, Gaspar e publicado por Fundação de Cultura do Recife

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o qual, não se apegando servilmente a nenhum parecer, sempre que sobrevinha a necessidade, moderava prudentemente as ordens de seu chefe. Não se segue sempre o mesmo caminho: adaptamos mais do que mudamos as resoluções dos superiores; viramos o Brasil qual uma nau, conforme as tempestades da República, dirigindo-nos todos para um só porto, se bem tomando rumos diferentes. Para que arrastar, odiosa e desprezivelmente, a esta comédia a estima e o acatamento dos Estados Gerais, como se tivessem resolvido coisas que não podiam eles garantir a Artichofski, quando são terríveis ao potentíssimo rei da Espanha e mostram, com suas armas vitoriosas por toda a parte, quanto valem?Confere-nos Artichofski o soberbo título de Delegados plenipotenciários. Sem injúria nossa nem da verdade, não deveria recusar-nos a qualificação de fidelíssimos servidores da Companhia. Tomamos mais a peito a prosperidade e a incolumidade da Companhia do que esses tais contratos feitos na Holanda, mudáveis segundo a variação das circunstancias. E não com outro fim ordena ela as medidas mais prudentes, senão para não faltar a nossa prudência, e quer que lhe modifiquemos as prescrições, segundo os ditames da lei suprema - a salvação pública. [^nota-114] Li-lhes isto mesmo, diz Artichofski, respondam o que quiserem. Ouço realmente palavras cruas e desrespeitosas para os superiores, com as quais ele pisa a dignidade daqueles a quem devera obedecer.Quando diz que se vê a braços com uma soldadesca indisciplinada, que o desconhece e é dele desconhecida, fala palavras ofensivas aos soldados. Em todo o caso pretende parecer que agüenta sozinho todo o peso da guerra e esteia com o seu regimento as terras brasileiras. Considera sombras e nomes os que não se acham sob a sua disciplina. Alega Pompeu, Petréio, Afrânio, Aníbal, sendo ele muito dessemelhante de todos. Blasona de haver resistido a 3.000 inimigos com oito companhias. Mas, se alude ao combate que travou em Porto Calvo com D. Luiz de Rojas e Borja, defrauda de merecida glória capitães estrenuíssimos. aos quais, coagidos a pugnar sem esperar-lhe a ordem, se deve a vitória. Se, ao contrário, se refere ao cerco do Castelo Real. neste se houve de tal sorte que, na esperança incerta de ferir ao governador, parecia querer gastar toda a provisão de pólvora, se, avisado da mingua dela, não arrefecesse o seu inconsiderado furor.De três coisas pede que se lhe conceda uma: ou enviarem-se-lhe outros soldados, ou restituírem-se-lhe os que lhe foram tirados.