aparato bélico, embora se haja escrito circunstanciadamente a respeito disto aos diretores da Companhia.Acham-se as naus apercebidas sobre as âncoras, com mil homens de armas, prestes para a expedição, com o almirante da esquadra e o tenente-coronel do meu regimento, e entretanto vou dissimulando tal expedição. De feito, só compareço ao Conselho, sendo chamado, e não me é licito falar senão interrogado. Aguardo as ordens de meus superiores, as quais desejo cumprir como soldado honesto, se disto não fora impedido por me serem retirados diariamente os meios de o fazer. Estas coisas me trazem preocupado dia e noite, apresentam-se-me em sonhos, transformando-se para mira em bílis e negra peçonha. Esta é a realidade: não mandam os diretores da Companhia reforços para se restaurar o exército; faltam marinheiros, artífices, escreventes, praças de engenharias e outros trabalhadores necessários nos quartéis. Meu regimento é obrigado a suprir a míngua de tudo isso, e, o que mais é, alguns dos meus, dando baixa, ficaram senhores de si, conforme o costume da Companhia; alguns outros foram transferidos para outras companhias, sob outros comandantes, de sorte que do meu regimento saíram até hoje trezentos homens, os quais apontei nominalmente num índice, excetuando os que se retiraram por doença. Neste ínterim, naus que zarpavam para a Holanda apressaram-me o desejo de escrever.Em se me oferecendo ensejo, escreverei acinte ao Conselho dos Dezenove sobre esta matéria. Diariamente sou importunado com a transferência de soldados de minhas companhias para outras e vice-versa. Não posso atalhar tempestivamente este inconveniente pelo súbito das ordens. Em algumas companhias que, ao partirem da Holanda, tinham 150 homens, mal restam 100. E ocorreu isso no próprio momento da minha chegada, antes de se passarem dois meses desde que aportei aqui. Que há de ser no bimestre seguinte ou após o quadriênio" E não se notará acaso nas outras companhias a mesma infelicidade e deficiência das minhas" E esta é tal e tamanha que nem um só dos tenentes-coronéis pode conhecer bem o regimento que lhe cumpre comandar. Notai, peço-vos, em que posição estou aqui, de que autoridade gozo, que atenção me prestam. O Conde provê em outros os postos vagos em minhas companhias. E até agora ninguém se encontrou que de mim se aproximasse com o respeito e as continências devidas ou pedisse o meu favor. Nas minhas companhias nem eu nem meus oficiais mandamos, e sim outros, que de freqüente removem os soldados antes de eu o saber
História dos feitos praticados no Brasil, durante oito anos sob o governo do ilustríssimo Conde João Maurício de Nassau.
Escrito por Barleus, Gaspar e publicado por Fundação de Cultura do Recife