História dos feitos praticados no Brasil, durante oito anos sob o governo do ilustríssimo Conde João Maurício de Nassau.

Escrito por Barleus, Gaspar e publicado por Fundação de Cultura do Recife

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balhos um inimigo oculto, que tenta romper a unidade deste corpo, no qual nada está perturbado ou discorde, e abalar e destruir a organização ainda pouco firme da República? Portanto, dirijo-me a vós, companheiros a mim dados pela Companhia, como a testemunhas de minha vida e de todos os meus atos, pois, quando se vive entre uns, é difícil defender uma causa perante outros.Nunca neguei a Artichofski a honra, a autoridade e o direito que lhe são devidos, e não é justo que eu tolere um solapador da minha jurisdição, da minha dignidade e do meu nome. É um só o corpo desta república e há de ser regido pelo espírito de um só: a gestão suprema e geral me pertence: a dos outros é delegada e repartida. Acolho Artichofski como auxiliar de meus trabalhos e encargos, mas repudio-o como ditador: esta partezinha do Brasil não comporta dois governadores. Se divergirmos, se nos separarmos por emulação, por injustas suspeitas, partiremos a partezinha, e então já não é preciso aos espanhóis o vencemos, porque, graças às discórdias civis, seremos vencidos por nós mesmos. Temos para unir os nossos pensamentos, sem que nos apartem rivalidades, para deliberarmos em comum contra um inimigo comum. Os mais funestos males políticos, a peste dos Estados, são as contendas e parcialidade dos governantes: são mais danosas que as próprias guerras externas, a fome, as doenças. É vergonhoso e pernicioso degladiarem-se na mesma nau os remadores e marinheiros. Não faltam detratores ocultos à presente situação: precisamos de franqueza, de lealdade, de constância no direito. É assim que militam os bons, assim temos sempre militado.Diante disso, rogo-vos decidais uma de duas: ou mandardes-me para a Holanda para eu dar lugar a Artichofski, ou mandarde-lo para dar-mo ele a mim. A razão, a estabilidade do Brasil, a salvação e a prosperidade dos nossos aliados aconselham que se faça isto.

Retira-se o Conde para uma saleta.

Vou retirar-me para não parecer que, com a minha presença, influí nos votantes ou inclinei os sufrágios ao meu voto. Sempre tivestes da minha parte juízos livres e sempre os tereis. Dentro da vossa sabedoria, procurareis que nem a indignação, nem a afeição destruam essa liberdade".Ao terminar, levantou-se, dirigindo-se para uma saleta próxima, apesar de lhe pedirem os conselheiros, instante e respeitosamente, que se não retirasse.Atônito com aquele discurso, o Conselho, após longa e atenta deliberação, acordou nisto: que, retidos no Brasil tanto o Conde