História dos feitos praticados no Brasil, durante oito anos sob o governo do ilustríssimo Conde João Maurício de Nassau.

Escrito por Barleus, Gaspar e publicado por Fundação de Cultura do Recife

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uma confusão de facinorosos e de perdidos. Mesclando-se a estes, degeneram os melhores, os bem dotados de ânimo e de caráter.Acreditava-se, porém, que os que assim falavam, tratavam, sob color do bem público, da sua utilidade particular, se bem não faltassem nas reuniões palavras especiosas e sentenças plausíveis, nas quais autorizavam a sua causa.

Vantagens das colônias.

Os defensores da liberdade comercial alegavam que se guardam melhor as possessões por meio de colônias do que pelas armas; que elas se estabeleceriam, concedendo-se a todos a faculdade de comerciar, e não se fundariam, se os administradores da Companhia, em número tão diminuto, tivessem a gestão exclusiva do comércio; que, com a multidão dos cidadãos, crescem as rendas públicas. Além disso faltavam à Companhia, com o erário esgotado pelas despesas e o crédito abalado, recursos bastantes para garantir o monopólio, porque o tráfico, a guerra, o sustento, a roupa e outras necessidades dos habitantes exigiam muitos gastos, e não havia esperança, longínqua embora, de se remediar tal penúria. Entretanto, nem a guerra, nem o comércio se podem fazer sem dinheiro, assim como não se podem os corpos mover sem nervos.

Parecer do Conde

Havendo os diretores pedido a Nassau o seu parecer, explanou-lho em carta desta substância: Toda a salvação da Companhia estava na união dos seus dirigentes e toda a ruína dela viria da sua discórdia. Enquanto, com aquelas contendas e deliberações, se buscam remédios, se ia, neste meio tempo, esgotando e arruinando Sagunto. Não ignorava ser perpétua sorte da verdade gerar o ódio dos que sentem de modo diverso. Era-lhe porém, preferível a lealdade à condescendência e o antepor a vontade de ser útil ao desejo de ser agradável. E, conquanto lhe fosse mais fácil dizer sua opinião que dar conselho, não obstante, ia apresentar alvitres, sem qualquer paixão, desviando, porém, de si os ódios que lhe pudessem advir de um resultado talvez imprevisto; porque, quando de boa fé se pede conselho, não se devem imputar ao conselheiro os sucessos desastrosos. Exageram-se, dizia ele, os lucros que tocavam outrora aos particulares, os quais poderiam ser da Companhia. Tinha, porém, desde então mudado a situação do comércio e das coisas. Antes, quando nos apoderamos desta parte do Brasil, tudo estava nas mãos dos diretores; agora porém, está, mediante contratos, também nas mãos de particulares. Antes, aqui se encontrou muito açúcar nos trapiches dos portugueses e poucas mercadorias nossas, das quais necessitassem. Assim, os holandeses as permutavam por açúcar,