História dos feitos praticados no Brasil, durante oito anos sob o governo do ilustríssimo Conde João Maurício de Nassau.

Escrito por Barleus, Gaspar e publicado por Fundação de Cultura do Recife

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Combate naval entre Schaap e os espanhóis - Cartas de portugueses interceptadas

Com o rodar do tempo, não faltaram seus casos à fortuna das armas assim na terra, como no mar.Travando combate naval, entre a Baía de Todos os Santos e a Torre de Garcia de Ávila, com algumas naus espanholas, pelejou bravamente o capitão Schaap, marujo em extremo valoroso. De uma delas teve de abrir mão por muito possante e apercebida de soldados e artilharia; outra encalhou-a nos parcéis da costa e só conseguiu por despojo da vitória a terceira. Recebendo um ferimento, ficou aleijado, mas à pátria se mostrou útil e glorioso. No vaso capturado, encontraram-se maços de cartas escritas pelos portugueses, as quais nos revelaram, com juízos diferentes, os planos e intuitos dos espanhóis contra nós. Algumas havia que referiam estarem fundeados no Tejo, diante de Lisboa, dez galeões e em Cádix vinte, aos quais se iriam juntar trinta naus de transporte. Era opinião de uns tantos que se aprestava aquela armada para o Brasil; era a de outros que simulara o rei esta causa de necessidade, segundo o costume dos príncipes, para se apoderar, com tal pretexto, do dinheiro do povo, pois aos portugueses importava a restauração do Brasil. Neste desígnio, exigira o monarca novos impostos, o quinto dos bens. Isto levantara o povo a tal ponto que, agredindo os exatores reais, os haviam trucidado em diversos lugares. Os castelhanos, folgando com esses levantes, exerciam mais duro império contra os portugueses, a título de rebelião. O rei em pessoa se pusera à frente de um exército para reprimir os povos de Évora, do Além-Tejo e dos Algarves [^nota-97]. Havia outras cartas que declaravam já estarem serenados os tumultos e procederem da plebe as desordens, tendo-se a nobreza conservado quieta; que em breve a armada se faria de vela para o Brasil, a fim de restaurá-lo. Deveria comandá-la o conde de Liniarez; que, entretanto, definhava ele, minado por um veneno. Oquendo demandaria Cádix para aprestar a frota, cujo comando lhe seria dado.Estas notícias não abalavam muito o Conde, não só porque não poderia a armada aportar nos meses do inverno, mas ainda porque eram incertas as outras informações, impedido o rei com a guerra contra a França [^nota-98]. Este, como traziam aquelas cartas, entregando-se mais à caça, procurava compensar, com lançar-se aos prazeres, a perda de suas terras e cidades, a ele arrebatadas pelo francês e pelo batavo triunfantes.

Maurício medita novas empresas.

Maurício, portanto, julgou de vantagem, enquanto estava suspensa a empresa dos espanhóis, valer-se das condições favoráveis para aumentar, em novos cometimentos, os domínios da Companhia.