História dos feitos praticados no Brasil, durante oito anos sob o governo do ilustríssimo Conde João Maurício de Nassau.

Escrito por Barleus, Gaspar e publicado por Fundação de Cultura do Recife

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Política, L. I. - Guerra das Gálias, L. I. - LII - HIST. NAT., liv. 33, c I.

humanas. Onde ele se usa, insinuam-se menos nas repúblicas os contágios dos males de nações separadas, visto que é mais difícil o transporte das veniagas e objetos e mais fácil o do dinheiro. Por essa razão guerreando Cesar aqui [^nota-67], os mercadores raramente iam ter com os belgas do interior e levar-lhes as coisas que servem de efeminar os ânimos. E segundo o testemunho do mesmo escritor, não tinham tampouco entrada no país dos nérvios, os quais não lhes deixavam levar ali vinho algum, nem outras superfluidades, julgando que tais coisas afrouxavam as virtudes. Mas entre os neerlandeses de hoje, tanto do interior como do litoral, não só têm os mercadores entrada freqüente (quem dirá se numa idade mais feliz ou mais infeliz?), mas ainda, pelo desejo de comerciarem, gostam de espalhar-se por todas as plagas do mundo, já permutando utilidades por utilidades, já resgatando-as com dinheiro, já escambando o próprio ouro por outras coisas. Portanto, consideram vã esta exclamação de Plínio : "Oxalá se pudesse rejeitar totalmente da vida o ouro, essa fome execranda, como disseram celebríssimos autores, o ouro, difamado pelos insultos dos melhores homens e achado para a ruína da vida."

Descrição dos negros.

A respeito dos negros, porque amiúde ocorrem nesta história, convém explicar o seguinte: - são povos daquela parte da África, que, após a Barbária, a Numídia e a Líbia, é a quarta, e se chama Terra dos Negros, nome que tira ou dos naturais, que são de cor negra, ou do rio Niger, o qual corta a região pelo meio, fecundando os campos vizinhos à maneira do Nilo. É limitada ao norte pela Líbia, ao sul pelo Oceano Etiópico, ao ocidente pelo reino de Gualata e ao oriente pelos reinos de Goaga. O ar, junto às costas da Guiné, é nocivo aos nossos compatriotas, por causa do excessivo calor e das chuvas, que geram a podridão e os vermes. É pouco verossímil ser a negrura dos íncolas devida à adustão do sol, pois os habitantes do Cabo da Boa Esperança são muito pretos, e os espanhóis e italianos, a igual distância do equador, são brancos. O sol não é menos tórrido no estreito de Magalhães, onde são brancos os naturais, do que nos extremos da África, onde são pretos. Os súditos do Preste João são trigueiros, e os habitantes da ilha de Ceilão e da região de Malabar são muito negros, não obstante se acharem na mesma latitude. Demais, por toda a América, até mesmo nos países intertropicais, não se encontram negros em parte alguma, salvo uns poucos no lugar denominado Quareca. De sorte que a causa da cor da cútis parece dever-se atribuir antes às qualidades ocultas da terra, do céu e do ar (asilos, oh! pesar! da humana ignorância)