História dos feitos praticados no Brasil, durante oito anos sob o governo do ilustríssimo Conde João Maurício de Nassau.

Escrito por Barleus, Gaspar e publicado por Fundação de Cultura do Recife

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convivência, os costumes e a religião dos portugueses, e por isso mostrariam ânimo hostil contra nós; que tais empreendimentos seriam danosos à Companhia das Índias Orientais, dispersando os seus marinheiros e armamentos por várias esquadras e parte do mundo; que entre uma e outra Companhia seriam fáceis as rivalidades, suscitadas pela inveja dos lucros, e bem assim por algumas mercadorias comuns, e por idênticas necessidades da guerra e do tráfico, a saber, armas, soldados, petrechos náuticos e marujos; que do Ocidente não se poderiam esperar reditos bastantes para proteger-se militarmente a boa fortuna, ainda quando ela se alcançasse; que não convinha irritar com mais lutas o poder de rei tão forte, nem era prudente mostrar os pontos em que somos desiguais; que semelhantes tentames, feitos pelos ingleses, tinham tido êxito mais de temer que de desejar.Diziam os escrupulosos que cumpria por freio à paixão de dominar e conter a ambição de chamar tudo a si; que era tentativa estulta e contrária à religião despojar o rei da Espanha de todas as suas possessões; que os batavos tinham cobiça bastante para se apropriarem de tudo, mas não forças para o guardarem; que uma grande potência provoca, a princípio, a inveja e logo os ódios dos vizinhos e que, portanto, devia ser a fortuna tratada com respeito por aqueles que, de uma situação humilde, se haviam elevado ao fastígio da segurança; que valia mais decidir onde nos fixaríamos do que ficarmos sempre procurando para onde ir; que estão em terreno mais resvaladio os que mais conquistaram, e mais em seguro os que traçam limites às suas forças; que os neerlandeses, afeitos ao trabalho e ao sofrimento, iriam corromper-se e embotar-se com o contágio dos deleites exóticos e com a ociosidade.Os versados em história e nos exemplos da antiguidade declaravam serem estas as palavras dos povos bárbaros: "Guardar o que é seu bastar a um particular; ser honroso aos reis o pugnarem pelo que é dos outros; julgarem estar a sua máxima glória num vastíssimo império [^nota-15]". Um povo prudente deve acautelar-se de perder, por uma cobiça desmarcada, o que ganhou, e mormente um povo cristão, para não lhe quadrar o que dos romanos disse Gálgaco [^nota-16] capitão dos britanos: - não os haver saciado nem o Oriente, nem o Ocidente, a eles que tinham por magnífico tudo quanto lhes era desconhecido, e que, depois de lhes faltarem as terras velhas para vencerem, iriam descobrir novas, ainda mesmo além dos mares. Ambição assim exprobaram-na os Citas a Alexandre, porque forcejava para segurar com uma das mãos o Oriente e com a outra o