História dos feitos praticados no Brasil, durante oito anos sob o governo do ilustríssimo Conde João Maurício de Nassau.

Escrito por Barleus, Gaspar e publicado por Fundação de Cultura do Recife

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Causas justas e eqüitativas.

A liberdade comercial foi sempre o baluarte de uma grande potência. Com ela cresceram os tírios, os cartagineses, os persas, os árabes, os gregos e os romanos. Por isso, os nossos navios mercantes, comboiados pelas nossas armadas, navegaram primeiro para o Oriente, depois para o Ocidente, fundando fora da Europa, como que dois impérios, sustentados por duas companhias. O holandês tentou no Oceano derrotas tanto mais extensas quanto mais enclausurado se sentia nas acanhadas fronteiras de seu país, espalhando o seu tráfico e poderio por toda a parte onde brilha o sol. Discutiram os castelhanos e os portugueses se era isso jurídico, como se, após as batalhas e a guerra, houvesse lugar para as leis e para as incertas controvérsias dos jurisconsultos. Não obstou a tais empreendimentos nem a doação feita pelo papa Alexandre VI aos portugueses e aos espanhóis, pois é permitido a alguém ser liberal do seu e não do alheio; nem a prescrição aquisitiva, inaplicável às coisas pertencentes a todo o gênero humano; nem o descobrimento, o qual nenhum direito dá sobre terras que sempre tiveram donos; nem o direito de guerra, o qual, foi para nós tão justo contra os portugueses quanto o foi para estes contra os índios. Fomos para onde nos chamava o direito natural e o das gentes e a carência mútua de produtos, porquanto o ganho é poderoso incentivo para se tentarem os mais arrojados cometimentos. Uma plebe faminta e desprovida dos regalos e comodidades da vida ignora o que é temer: o desejo de ter e de dominar impele a coragem humana aos mais arriscados lances. Por onde abre caminho a cobiça das riquezas, por aí também o abre a ambição do mando; onde encontra aquela a sede da sua mercancia, acha esta a da sua dominação. É fato antigo que são mais renhidas e certas as lutas onde são mais crescidos os despojos e os lucros.

Impedida a navegação e o comércio por maus conselhos.

É parecer das pessoas sensatas que péssimos conselheiros ouviu o rei, quando proibiu aos holandeses o acesso à Espanha e às Índias. Sempre lhes foi fácil tolerar os medidores da terra, mas nunca os do mar. Portanto, propelidos pela necessidade, rumaram para donde as incertezas do mar, as distâncias imensas e mais ainda a novidade do tentame os dissuadiam de ir, para trazerem eles mesmos as mercadorias que estavam acostumados a comprar, primeiro aos venezianos e depois aos espanhóis e portugueses. Alegavam-se exemplos da idade antiga e da moderna, nos quais se mostrava haverem sido perniciosos aos imperantes os mares fechados e o tráfico dificultado, pois a audácia e o desespero não respeitam semelhantes obstáculos e franqueiam aos navios a entrada nos