História dos feitos praticados no Brasil, durante oito anos sob o governo do ilustríssimo Conde João Maurício de Nassau.

Escrito por Barleus, Gaspar e publicado por Fundação de Cultura do Recife

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Nassau liga o Recife à Ilha.

Empreitou o Conselho a construção dela por 240.000 florins. O construtor, iniciando o serviço e apertando com diligência o trabalho dos seus operários, depois de ter levantado alguns pilares de pedra, chegara ao leito da corrente, onde é maior a profundidade, calculada em onze pés geométricos ainda na baixa-mar. Perdendo, pois, a confiança em si e na sua arte, desesperava de executar a obra. Confessou que pode mais a natureza que a arte, não devendo as pessoas prudentes tentar o impossível; que só com o auxílio divino se poderia consumar aquela tentativa; que se teria de levantar a alvenaria desde o fundo à maior altura, não dando descanso o curso impetuoso do rio, nem tão pouco o Oceano, o qual se embraveceria com tanto maior violência quanto mais estreitamente se apertasse; que o Beberibe, rápido em excesso, arrebatado, às vezes crescido com grande massa de chuvas, removia para longe as margens, e onde era mais estreito se mostrava mais feroz e vorticoso.De certo, cumpria ao construtor considerar tudo isto antes. Para suspender a obra usaram de descrédito aqueles que receavam e com razão, que, concluída a ponte, muitos mudariam do Recife para a ilha, por mais aprazível, baixando os preços das casas. Além disso cartas queixosas de alguns holandeses davam o Conde como o instigador daquela obra, baldando-se, em detrimento público, um trabalho tão dispendioso. Diziam que tinham sido sorvido pelas águas, num esforço inútil, 100.000 florins, e que o serviço interrompido, a ponte suspensa pela metade e os pilares exprobravam os que haviam empreendido tantas coisas vãs. Assim pareciam queixar-se, não sem visos de razão, aqueles que, acostumados com os cálculos particulares, se afizeram a medir pela mesma bitola as coisas úteis e as dignas do comando supremo.Ignoram que é diversa a condição dos príncipes, cujo objetivo precípuo deve ser alcançarem fama. Julgando Maurício que importava à sua honra terminar o que tomara a peito e que era de um caráter fraco desesperar do interesse geral pela desesperança de um só, meteu ombro à empresa, e, reunindo material de todos os lados e à sua custa, principiou a estear o resto da ponte, não em pedras, mas em madeira. Cortaram-se árvores nas matas, e das árvores se tiraram traves, com 40 a 50 pés de comprimento, impermeáveis à água pela dureza. Quis Nassau que fossem elas as estacas e botaréus da ponte, cravando-se no fundo, com o auxílio de martelões, até doze pés, umas verticais, outras oblíquas, para obedecerem à correnteza.