ele os seguiria assim que estivesse curado, num navio mandado preparar especialmente para esse fim.Os soldados, e marinheiros dessa esquadra, instruídos pelos outros recém-chegados do estado e calamidade em que tínhamos deixado o Brasil, dos padecimentos e trabalhos enfrentados na viagem até lá, durante a estada e na volta, e a maneira pela qual eram tratados, quiseram dar o dito por não dito e se recusaram a seguir. Todos os que conseguiram obter licença para descer à terra trataram de evadir-se, esconderam-se e não voltaram mais; em conseqüência disso, os que estavam embarcados murmuraram ainda mais e fizeram grande bulha.Os burgomestres das cidades e portos da Zelândia proibiram os mestres dos navios e barqueiros de conduzir alguém para fora de sua província sem licença expressa assinada por eles, sob graves penas. Entrementes mandaram procurar todos os soldados alistados, para serem reembarcados. Alguns tripulantes quiseram amotinar-se; os navios dos Estados, que guardavam os portos e enseadas, ameçaram por a pique as suas naves. Entretanto, para fazê-los voltar às boas pacificamente, foram dados a cada soldado três reais de adiantamento sobre seus ordenados, e não de presente, como imaginaram, e cerveja à vontade pelo espaço de um dia. Isso feito, a frota largou a âncora no fim de dezembro de 1647, ao ribombar dos canhões, e tomou o caminho do Brasil.
Os alistadores de soldados para as Índias, vendedores de cristãos. Razões plausíveis desses vendedores de cristãos para alistarem soldados para as Índias.Não se deixou de recrutar outras tropas em todas as Províncias Unidas, para enviá-las em outra esquadra. Ocorreu, então, na cidade de Midelburgo, um episódio curioso com dois rematados velhacos, que naquele país se chamam vendedores de cristãos, pois toda a sua arte está em enganar os jovens estrangeiros, que observam, e persuadi-los a fazer a viagem das índias; seduzem-nos e lhes descrevem os países distantes como um paraíso terrestre, que proporciona todas as felicidades desejáveis; prometem uma grande fortuna; retêm--nos em suas casas com grande estima e fornecem-lhes dinheiro até o momento da partida, quando mandam apreender e reter os ordenados desses tolos, logo que embarcam, pela despesa feita em sua casa, contada ao quádruplo daquilo que vale. Procedem de tal modo que, em dois meses, fazem-nos gastar o que no futuro só poderão ganhar em dois anos. Estes marotos tentaram enganar desse modo seis jovens franceses, dos quais cinco acabavam de chegar da França, e o outro tinha voltado recentemente do Recife com aqueles cinco navios que havia pouco tinham ancorado, o que estes malandros não souberam distinguir. Perguntaram-lhes, ao abordá-los, se não queriam imitar tantos belos jovens que empreendiam a viagem ao Brasil; tal curiosidade era peculiar às pessoas intrépidas e lhes aproveitaria de mil maneiras, à vista de uma tão longa extensão de mar e de terra. O país era em si mesmo excelente, a guerra boa, os holandeses tinham predomínio sobre os portugueses e se enriqueciam com os seus bens, que estavam entregues ao saque. Depois de três anos, cada um voltaria carregado de ouro e prata. Eles, que lhes falavam, acabavam de voltar, e não se julgavam felizes senão em um país tão bom, onde iam fixar residência. Bem viam, pelas suas fisionomias, que tinham demasiado sentimento de honra para deixar passar a ocasião de adquirir tanta glória; bastava decidir-se, que eles fariam dar bons soldos e bom tratamento. Estes cinco franceses teriam sido facilmente persuadidos se não fosse o recém-vindo que lhes tinha falado do Brasil de maneira inteiramente diferente e a cujas palavras davam muito maior crédito que às desses impudentes mentirosos. Quiseram castigá-los, fingiram que desejavam o que eles lhes sugeriam, fizeram-lhes algumas perguntas, depois falaram em beber e, em seguida, foram para uma taberna retirada, onde estes mentirosos sofreram enorme surpresa, porque, em vez de alistarem os seis homens, receberam grande número de bastonadas que marcaram seus corpos de listas, e ali