História das últimas lutas no Brasil entre holandeses e portugueses

Escrito por Moreau, Pierre; Baro, Rouloux e publicado por Ed. Itatiaia. Ed. da Universidade de São Paulo

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Dificuldade para a sessão.Depois de terem os novos Senhores exibido suas cartas de provisão àqueles que encontraram nos cargos, estes lhes cederam incontinenti o lugar. Tomando posse desta dignidade, houve dificuldade entre os Conselheiros para a sessão; dois dos escolhidos pela Câmara de Amsterdão eram simples negociantes, como dissemos,* os Senhores Trouwel e Haecx, de modo que os Senhores Van Goch e de Beaumont, letrados e oficiais em sua pátria, não admitiam que estes os precedessem. Mas o Presidente Schonenburgh ordenou que cada mês, sucessivamente, um deles se sentasse a seu lado; que um dos de Amsterdão começaria, a seguir viria o Senhor Van Goch, depois o Senhor de Beaumont e após o outro de Amsterdão. Logo souberam que suas forças não chegavam à metade do que seria necessário para atacar os portugueses; censuraram fortemente os antigos Senhores por haverem pintado o mal menor do que era, e por não terem escrito a verdade (eles o haviam feito de propósito, para que mais facilmente se encontrassem outros que os viessem substituir). Os oficiais de justiça, capitães e soldados, marinheiros, burgueses e habitantes, todos queixaram-se de seu governo, uns de um modo, aqueles de outro. Voltando à Holanda, não foram recebidos nem pelas Câmaras, nem pela Companhia das Índias, mas apenas por particulares, os Dezenove os consideraram com desprezo. Por todas as cidades corriam e eram vendidos publicamente libelos difamatórios impressos contra suas pessoas, seu procedimento no governo, e várias pessoas interessadas os ameaçaram de processo.O acesso destes Senhores à magistratura, ao invés de ter sido secundado por alguns acontecimentos felizes, parece ter feito que a má fortuna se declarasse contra eles. A primeira notícia que lhes foi trazida foi a de que a maior parte dos tapuias e brasilianos, que sempre tinham sido aliados dos holandeses e combatido a seu serviço, os havia abandonado e adotado o partido de seus inimigos, por ódio àquilo que Joris Garstman, general da milícia, fizera seis meses antes, mandando matar o alemão Jacó Rabbi; este homem intrépido de tal forma se adaptara a estes selvagens em seus costumes e modo de viver, que se tornara como se fosse um deles, e estes de tal modo a ele se afeiçoaram, que o fizeram um de seus principais capitães. Segundo os amigos de Garstman, o motivo pelo qual este mandara matar Jacó Rabbi devia ser atribuído ao ressentimento pela morte e assassinato do pai de sua mulher, cometido por Jacó Rabbi. Este escolhia os piores tapuias e com eles efetuava diversas pilhagens no país: sua morte, pois, diziam, só apresentava vantagens para o público, e Garstman fizera muito bem em vingar a morte de seu sogro, tirando do mundo um ladrão que merecia cem vezes o suplício; em todo caso, tratava-se apenas de uma formalidade para puni-lo, porque ele devia mesmo ser condenado. Os que conheciam particularmente Garstman e podiam julgar as suas ações sustentavam que outros tinham sido os seus motivos: sabendo que Jacó Rabbi reunira, com o fruto de seus roubos, uma rica presa e a escondera em lugar que ele bem conhecia, mandara matá-lo para disso tirar proveito; e, com efeito, encontraram-se em seu poder algumas jóias, reconhecidas por aqueles que Jacó Rabbi tinha roubado.Logo que Janduí e todos os seus principais amigos souberam desta morte, solicita-ram a entrega de Joris Garstman para que eles próprios o justiçassem, por ter matado um de seus chefes; o conhecimento do fato, caso Garstman fosse culpado, lhes pertencia, de acordo com o privilégio que lhes tinha sido outorgado pelos Estados Gerais e a Companhia das Índias, de somente eles serem os juizes dos criminosos de sua nação. Jacó Rabbi não podia ser acusado de coisa alguma e jamais traíra o país. Quanto ao assassinato do so-gro de Garstman, este é que dera o motivo, como todos sabiam muito bem; quanto aos seus roubos e furtos, se ele tinha tomado gado, era somente para viver, pois não era razoável que ele e sua gente morressem de fome quando lhes era recusado comida. Se tomara instrumentos de ferro, era para servir-se deles no campo, a serviço dos próprios holandeses,