onde vivera; olhava o rosto adusto dos índios e dos negros; mirava armas e habitações diferentes.Voltavam ao nosso latinista as reminiscências clássicas transportadas às terras americanas. "Via Coridões e Filis de narizes chatos, lábios grossos, mamas pendentes, conduzindo armentos e rebanhos diversos dos europeus.Outros gêneros de aves, outros gêneros de peixes abasteciam-lhe a mesa, quando jantava.Ditirambicamente, continua o panegerista: "Dali passeava os olhos por aqueles mares, que dominava com as suas frotas, e pelas terras que sujeitava com a sua autoridade, com os suas armas e leis. Meditava ali na guerra contra a Baía, nos castigos dos depredadores, no terror que incutiria á armada, quando chegasse, e nos descansos e vantagens que proporcionaria aos seus. Ali temperava com prudentes alvitres as ordens da Companhia. Enfim, meditando, encerrava dentro do âmbito da Boa Vista, o múltiplo benefício do céu, da. terra e do ar, a República, o inimigo, os índios, os holandeses, as conveniências e proveitos das Províncias Unidas".Nesta Ilha de Antônio Vaz existia não só o palácio, mas também o Museu do Conde, para o qualtraziam as naus vindas da índia Oriental ou da Ocidental, da África e de outras regiões, animais exóticos, plantas, alfaias dos bárbaros, trajes e armas, para espetáculo mais deleitoso e raro proporcionado ao Príncipe."As construções suntuosas causam amiúde a ruína dos potentados, e as obras feitas insensatamente tornam inúteis as somas com elas despendidas.Entretanto, a Boa Vista, edificada não só para recreio, senão para defesa da ilha de Mau-riciópole, eleva-se próxima da ponte do Capi-baribe, aterrando com descargas de mosqueta-ria, lançadas das guaritas, o inimigo que se aproximar".NIEUHOP que em sua permanência no Brasil pequeno período do governo de MAURÍCIO DE NASSAU apanhou (de 3 de outubro de 1643 a 23 de maio de 1644) relata maravilhas dos palácios e do parque do Príncipe.De Vryburgh, nobre edifício, do mais imponente aspecto tanto da terra como do mar, com as suas notáveis torres, balisas dos navegantes, relata que custara 600.000 florins.capítulo XIIIMarcgrave e Martius. - analise da obra do sábio de Liebstadt pelo autor da "flora brasiliensis". - elogios e censurasNada mais natural do que ocorrer ao maior de todos os tempos, desvendador da flora brasileira (e numa escala formidável, como tanto é sabido), a idéia de analisar o acervo de seu grande antecessor seiscentista. E assim a JORGE MARCGRAVE prestou CARLOS FREDERICO PHILIPPE VON MARTIUS a homenagem do seu Ensaio de comentário sobre as plantas nas obras de MARCGRAVE e Piso relativas ao Brasil, que em 1853 publicou na série dos Abhandlungen der Königlichen Bayerischen Akademie der Wis-senschaften (tomo VII, pp. 181-194, Munich). É como que uma réplica botânica ao Die Werke von Marcgrave und Piso über die Naturgeschichte Bra-siliens do ilustre LICHTENSTEIN.À gentileza do sr. Dr. HERBERT BALDUS, O tão justamente reputado cultor da nossa etnografia brasileira e americana devemos a tradução desta pequena monografia preciosa pela natureza dos comentários e o prestígio do nome do sábio da Flora Brasi-liensis. "Occupam as obras de MARCGRAV e PISO, indubitavelmente, o primeiro lugar entre os monumentos das primeiras letras da história natural do Brasil", escreve MARTIUS.Observa o famoso botânico que ao sábio de Liebstadt embora LICHTENSTEIN chame MARCGRAVE prefere dar-lhe o nome de MARCGRAV por ser esta a grafia mais comum. Mais acertado teria sido que não fizesse a restrição expressa no seu primeiro tópico. O monumento nlarcgraveano não era só brasileiro e americano, como mundial.Leiamos porém os comentários do grande naturalista de autoridade tão alta quanto universalmente acatada:"Assim como os escritos dos espanhóis GONZALO HERNANDEZ DE OVIEDO e FRANCISCO HERNANDEZ, devem ser considerados como as fontes primevas da história natural das Antilhas e do México, cabe esta glória a respeito do Brasil ao holandês GUILHERME PISO e ao alemão JORGE MARCGRAV. Foram as obras destes dois homens as primeiras consagradas exclusivamente ou, pelo menos, principalmente, à história natural do Novo Mundo.Os relatos da descoberta de COLOMBO e AMÉRICO VESPUCIO, as três narrativas de CORTEZ, as décadas de PEDRO MARTYR DE ANGLERIA, as obras históricas de F. L. GOMARA, PEDRO DE CIEÇA, DIEGO DE CAS-TILLO, JERONIMO BENZONI e outros trouxeram mui-tas notícias sobre a Natureza e os produtos do Novo Mundo apresentado como verdadeiro teatro de maravilhas à Europa admirada. Mas esses primeiros descobridores, conquistadores e cronistas não tiveram bastante tempo, ocasião e conhecimento para realizar e relatar investigações exatas da Natureza.No decurso do segundo século da descoberta da América manuseavam-se principalmente, as obras acima mencionadas e algumas outras oferecidas ao público curioso europeu por intermédio de numerosas traduções e compilações, como por exemplo a Collectio Grynaeo-Hervagiana (Novus orbis regio-num, etc. Basiléia 1532 fo.), as navegações de RAMU-SIO, HAKLUYT, THEODORO DE BRY, HULSIUS, etc, que, como indica o grande número das edições, foram recebidas com interesse.É verdade que, além delas, vários viajantes e funcionários portugueses e espanhóis haviam redigido importantes relatos sobre assuntos de história natural embora muitos deles permanecessem nos arquivos sem ser utilizados como se deu, verbigratia, com os trabalhos notáveis do jesuíta Barnabé Cobo. E muitos, quando finalmente impressos, só encontraram lenta e seródia via de penetração nos países da Europa oriental. Assim, também em épocas posteriores, não tiveram emenda certos preconceitos de europeus sobre a natureza e os produtos naturais do recém-descoberto continente, provindas das obras mais antigas a cuja lista queremos acrescentar, devido à sua influência especial, a "História natural e moral das Índias" de JOSEPH D'ACOSTA, cuja primeira edição é de 1590 e de Sevilha e a segunda de 1591 e de Barcelona.Estas obras das eras já longínquas, muitas vezes desfiguradas ao sabor dos aristotélicos e arabistas ou sob a influência de certas idéias monásticas, e transmitidas, sem crítica, de uma geração a outra, criaram opiniões errôneas e preconceitos a que, só mais tarde, eliminaram uma crítica sã e os resultados de investigações mais exatas."Haviam, os dois naturalistas do séquito de NASSAU inaugurado uma nova fase de muito maior rigor científico. "Os escritos de MARCGRAVE e PISO, distinguem-se de muitas obras antigas pelo pouco que relatam, em matéria de informes de outiva, consignam, na maioria dos casos, os da própria experiência, caracterizados pela vivacidade da observação, o desembaraço invulgar do juízo e o profundo
Escorço biográfico por Affonso de E. Taunay
Escrito por Taunay, Alfonso e publicado por Museu Paulista. Imprensa Oficial do Estado