[Das aquarelas que se incorporaram à Biblioteca Real de Berlim não se sabe bem como ali foram parar; afirma GUDGER.Em todo caso valendo-se de dados de DRIESEN pôde esclarecer alguma coisa.Em 1652 vendeu JOÃO MAURÍCIO DE NASSAU ao Eleitor de Brandenburgo por cincoenta mil tálera grande coleção de curiosidades brasileiras. Parece que não por dinheiro e sim por permuta com uma propriedade considerável situada na cidade de Cle-ves. A nota de venda ou o catálogo de tal coleção está datado de 18 de fevereiro de 1652 e assim como DRIESEN explica, no seu número 14, reza:"Um livro grande infólio régio, e outro um tanto menor encerrando figuras humanas, de quadrú- pedes, aves, répteis, peixes, árvores, ervas e flores em que todas estas coisas, que foram vistas e achadas no Brasil estão representadas em miniaturas habilmente feitas do natural, com os nomes, qualidades e particularidades que a elas se prendem (em etiquetas).O número 15 encerra mais de cem pinturas a óleo de índios e por este motivo não encadernados."Nota DRIESEN que dos dois volumes catalogados sob o número 14 encerra o primeiro 455 e o segundo 488 folhas, geralmente com um único desenho enquanto o inventário em certo lugar fala de cem e em outros de várias centenas.Seja como for desde que o número total de desenhos da coleção atinge hoje a 1.460 julga DRIESEN que deles só pequena parte foi adquirida por compra, provindo o grosso de um presente do Príncipe ao Grande Eleitor.Questão interessante é a que ventila GUDGER: quem terá sido o autor de tais pinturas?Lê-se em MANGET que MARCGRAVE era hábil pintor. Ele próprio, MARCGRAVE, declara na dedicatória da Historias Rerum Naturalium Brasiliae ao Príncipe JOÃO MAURÍCIO que executou as figuras do natural.J. DE LAET em sua súmula dos oito livros do sábio de Liebstadt afirma que as ilustrações foram desenhadas pelo autor da obra.A comparação entre as figuras do livro de MARCGRAVE e as das duas coleções demonstra con-cludentemente que elas procedem das aquarelas.Daí a bem fundada conclusão de que MARCGRAVE foi quem a estas executou. Pelo fato de que as aquarelas trazem notas marginais autografas do Príncipe JOÃO MAURÍCIO DE NASSAU (MENTZEL e outros afirmam expressamente que sua autoria é do Príncipe) SCHNEIDER, BLOCH e SWAINSON emitem a opinião de que foi ele quem as pintou.Por outro lado LICHTENSTEIN exprime a seguinte e pertinente suposição: "há aí terreno talvez para se pensar que o Príncipe que a estimava imenso haja feito tais acréscimos à menor das coleções e não à outra, notas de seu próprio punho".Ainda assim julga GUDGER que há fortes motivos para se pensar que o Príncipe executou alguns destes desenhos. Conta-nos LICHTENSTEIN que NASSAU auxiliado pelos cientistas seus assistentes estudou, descreveu e desenhou as plantas e os animais do Brasil.Comparando-se o manuscrito no trecho abaixo do lugar em que se acha a aquarela da arraia malhada e o fac-símile da carta autografa de NASSAU, que DRIESEN insere em seu texto, ocorre a suposição de que ambas as letras decorrem da mesma mão.LICHTENSTEIN que mais do que ninguém examinou esta questão da autoria das estampas parece contentar-se com a conclusão de que a maioria das aquarelas é da lavra de MARCGRAVE.Em cinco argumentos baseiou a sua dedução:1) a própria declaração do sábio de Liebstadtde que as executou o que BARLAEUS corrobora.2) o fato da letra dos títulos pertencer mais àcaligrafia alemã do que à holandesa.3) em matéria de parescença e colorido concordarem plenamente com as descrições de MARCGRAVE.4) os xilogramas da obra de MARCGRAVE seremem geral reproduções de tais originais.5) ninguém que não MARCGRAVE seria capazde executar tais aquarelas.Parecem-nos fraquíssimos os argumentos segundo e quinto de LICHTENSTEIN. Não era NASSAU holandês e sim alemão, portanto compatriota de MARCGRAVE e embora passasse a maior parte da existência nos Países Baixos, sua formação vinha a ser germânica, havendo aliás não muita diferença* entre ambas.Quanto ao fato de não haver quem pintasse tais aquarelas há a objetar contra LICHTENSTEIN a circunstância de que este grande zoólogo não deve ter tido grande conhecimento das particularidades da história da invasão e da ocupação holandesa no Brasil.Aduz JULIANO MOREIRA valioso documento novo e judiciosos comentários."Parece evidente que a mor parte da iconografia é obra de MARCGRAVE, porque em uma carta por ele escrita em português a LAET, em 1640, achada no Museu comunal de Leyde, dizia, ele entre outras coisas: Pelo presente temos 300 mais 50 e pouco mais plantas com as letras e o pincel diligentemente debuxados, etc.Depois, na dedicatória a NASSAU, declara ter pintado, ele mesmo, suas figuras (quorum ícones ad vivum ipse fecit). Além disto, LAET, no seu prefácio ao livro de MARCGRAVE, afirma haver ele desenhado as figuras que ilustram a obra.O fato de haver, à margem das aquarelas existentes na Biblioteca Real de Berlim, notas evidentemente escritas pela mão do Príncipe, induziu alguns autores a acreditar que este fizera, êle próprio, alguns desenhos.Não é isto impossível, porquanto no dizer dos contemporâneos muito se aprazia o Conde em trabalhar com MARCGRAVE e até confessar-se seu discí-pulo em ciência, como já o disse. A maioria, porém, das aquarelas é da autoria do sábio saxão.Quanto às outras pinturas a óleo, supõem alguns terem sido feitas pelo pintor FRANZ POST, irmão do arquiteto PETER POST, que também acompanhara a expedição de NASSAU. Possível é que assim fosse em parte.Dado, porém, o tempo que teria sido preciso para a grande soma de outros trabalhos deixados por aquele pintor, como seja a coleção que o laborioso membro e bibliotecário do Instituto Histórico Brasileiro Dr. PEDRO SOUTO MAIOR, descobriu no Louvre, e tendo em vista que MARCGRAVE, na afirmativa de seu irmão, também era pintor, inclino-me a crer que a mor parte dessas pinturas devemos ao pincel dele próprio".A tal propósito cabe, a talhe de foice, aqui aduzir um trecho da lavra de JOAQUIM DE SOUZA LEÃO FILHO, O nosso jovem e brilhante diplomata a quem as nossas letras históricas e sobretudo artísticas devem o inestimável serviço da publicação do seu "Frans Post e seus quadros brasileiros".Geralmente se acredita que JOÃO MAURÍCIO DE NASSAU trouxe ao Brasil três pintores: FRANZ POST, ALBERTO VAN EECKOUT e ZACHARIAS WAGNER, quando foram eles nada menos de seis.Ouçamos, porém, ao erudito autor brasileiro:"Dos seis pintores que NASSAU trouxera, segundo o próprio testemnuho, em carta a Luiz XIV, "quando ofereceu ao Rei-Sol diversas telas brasileiras, três apenas tiveram até agora os nomes revelados. São eles, além de FRANZ POST, O quase ignorado ALBERT VAN EECKOUT, holandês, cujos quadros, mais propriamente estudos etnográficos e naturezas mortas, encontram-se nos museus da Dinamarca - por presente ao Rei Frederico III -, e o saxão, ZACHARIAS WAGNER, de quem nos resta um livro de aquarelas da fauna nordestina".Esse "Thierbuch" contém aquarelas semelhantes às da alentada série de mil e tantas, além de uma centena de óleos, série ainda inédita e menos co- nhecida do que merece, a qual constitui uma das preciosidades
Escorço biográfico por Affonso de E. Taunay
Escrito por Taunay, Alfonso e publicado por Museu Paulista. Imprensa Oficial do Estado