Escorço biográfico por Affonso de E. Taunay

Escrito por Taunay, Alfonso e publicado por Museu Paulista. Imprensa Oficial do Estado

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de GUSTAVO ADOLPHO, O Leão do Norte, o recém assassinado duque de FRIEDLAND, de Sagan e de Mecklemburgo, ALBERTO DE WALLENSTEIN que recorreu diversas vezes à ciência astrológica de um dos maiores gênios da Humanidade, a um dos fundadores da astronomia moderna, a KEPLER? Mas MARCGRAVE, astrólogo de JOÃO MAURÍCIO DE NASSAU,apenas conquistou o pequeno relevo de uma singularidade biográfica pitoresca, ao passo que MARCGRAVE, astrônomo, observador de eclipses, solar e lunares, de Mercúrio e de Vênus, meteorologista, conseguiu inscrever o nome, inapagavelmente, nos fastos da Ciência Universal e da História americana, sob os títulos gloriosos de precursor e pioneiro.capítulo VIIIAnálise de gudger às obras impressas de Marcgrave. - conceitos de Bloch, Martius, Gunther, Jordan, Cuvier e Valenciennes. - as revelações de Schneider. - comentários de Juliano Moreira e de Gudger.

Falando da História Rerum Naturalium Brasiliae, assim a analisa GUDGER:A primeira parte do volume compõe-se da De Medicina Brasiliensi, de Piso. Compreende quatro livros.I -Ar, águas e localidades. II - Moléstias Endêmicas. III - Venenos e seus antídotos. IV-Do uso dos Simplices.Dedicou-a a GUILHERME DE AURIACUM, (nome provavelmente latinizado de Wilhelm von Aurich). Consta de 132 páginas infólio e está ilustrada com 104 gravuras, referentes aos livros III e IV. Destas, três versam sobre a mandioca e o fabrico de açúcar, nove sobre animais (cinco cobras, uma escolopendra, uma holoturia, um peixe-sapo e uma rã), e noventa e duas sobre plantas.A segunda parte é a contribuição de MARCGRAVE, e dedicada a NASSAU nos termos arroubados constantes da pág. V do texto da obra.Segundo MANGET foi esta dedicatória composta na cidade de Maurícia e verossimilmente como antecipação dos resultados da jornada africana do autor.Nas oito partes ou livros existem 429 figuras, na maioria cuidadosamente desenhadas pelo próprio autor, segundo declaração positiva ao pé do índice.Excluindo-se o livro VIII e o apêndice, com suas sete estampas, encontramos 301 plantas, descritas e 200 ilustradas. Dos animais há 367 descritos e 222 figurados. Destes 668 exemplares praticamente todos eram novos para a ciência e dos 422 originais das estampas, provavelmente, nunca nenhum havia sido anteriormente desenhado.Não obstante o fato de MARCGRAVE ignorar as subtilezas da classificação, baseadas na estrutura e posição dos estames e pistilos, nas flores, na contagem das barbatanas e linhas laterais de escamas nos peixes, seu trabalho sobre o Brasil marca indubitavelmente uma época.Trazendo ao conhecimento dos cientistas da Europa as maravilhas do Brasil, foi MARCGRAVE O o digno predecessor do Príncipe de Neuwied e de Spix e Martius.Sua história natural sobre as coisas do Brasil, é provavelmente o mais importante trabalho de seu gênero feito depois do reflorescimento dos estudos. E, até se tornarem conhecidos os resultados das expedições do Príncipe de Neuwied, constitui certamente, a mais importante obra jamais escrita sobre o Brasil.Mas a louvarmos a quem o merece, não deve o Conde JOÃO MAURÍCIO ser desdenhado, porque certo é que só graças a ele foi possível a MARCGRAVE realizar este maravilhoso trabalho. VAN KAMPEN compara-o a NAPOLEÃO, que em sua expedição ao Egito levou consigo grande número de sábios. Piso, contudo, compara o Príncipe a ALEXANDRE MAGNO.Se assim for o ARISTÓTELES DE NASSAU, era MARCGRAVE e não ele PisoQue todas as glórias revertam pois ao Conde JOÃO MAURÍCIO."Declara GUDGER não ter pretendido realizar análise extensa do tratado de história natural de MARCGRAVE. Isto em magna parte, desde muito está feito, com grande competência, sobre os animais, por Li-CHTENSTEIN, em uma série de comunicações feitas em (1814-1815; 1816-1817 e 1826) em que tanto salientou o valor do naturalista. E sobre as plantas por VON MARTIUS (1853-1855). Já LINNEU aliás creara a família das Marcgraviaceas, cujo curiosíssi-mo gênero das Marcgravias, é muito disseminado no Brasil, lembra JULIANO MOREIRA.Interessou-se GUDGER especialmente pela ictiolo-gia marcgraviana, e não lhe pareceu descabido, citar as apreciações de alguns dos maiores especialistas, neste grande grupo de vertebrados.Assim em 1828 na Histoire Naturelle des Pois-sons, diziam CUVIER e VALENCIENNES acerca de MARCGRAVE que fora certainement de tons ceux qui ont dècrit l' histoire naturelle des pays lointains dans le XVI e et le XVII e siècles le plus habile, le plus exact et surtout celui qui a le plus enrichi 1'histoire des poisson. II en a fait connaitre 100 (105 emenda GUDGER) tous noveaux a cette époque por Ia science et en donne des descriptions bien supèrieures à celles de tous les auteurs qui l'avaient précede". (Vol. I, pág. 60) .Em 1880 observa GUNTHER:"Estudando MARCGRAVE especialmente a fauna brasileira no livro quatro de sua obra trata dos peixes. Descreveu cerca de 100 espécies diferentes, todas anteriormente desconhecidas e de modo muito superior ao dos predecessores. As estampas que ilustram o texto são más, mas quase todas reconhecíveis, dando perfeita idéia da forma dos peixes".Em 1905 era JORDAN quem anotava:"Descreveu MARCGRAVE perto de 100 espécies de peixes, todas desconhecidas da ciência, com a nomenclatura portuguesa, tudo feito com muita inteligência e cuidado. Foi o seu trabalho o primeiro executado sobre uma fauna regional ocorrente além do Mediterrâneo.Daí decorreu grande prestígio para MARCGRAVE e o ilustre Príncipe de quem era assistente.Durante um século não houve qualquer outra tentativa importante de semelhante gênero".Tendo à mão, reproduções das figuras de MARC-GRAVE, num exemplar de sua obra que era de sua propriedade e outro da "Library of Congress", de Washington colorido a mão, quis GUDGER reproduzir em seu trabalho, as descrições por ele feitas, de dois peixes conhecidos, como prova da exatidão das observações do sábio de Liebstadt e o cuidado com que a elas se reportara.Tomou como primeiro exemplo tirado da "História Natural do Brasil", uma arraia pintada e de ferrão, a Actobatus narinari, animal cor de ferrugem, pintalgado de branco, cujos olhos e pintas são do tamanho de uma moeda da província natal do naturalista (nummus misnicus) e cuja carne tem bom paladar, sendo o animal tão volumoso que pode alimentar 40 homens".Interessante esta ingênua unidade de comparação a que o sábio recorreu o nummus misnicus, a moeda de seu distrito natal, a Mísnia.