Escorço biográfico por Affonso de E. Taunay

Escrito por Taunay, Alfonso e publicado por Museu Paulista. Imprensa Oficial do Estado

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durou vinte dias, e a terceira e mais curta compreendeu o tempo decorrido entre 8 e 19 de dezembro de 1640.Quantas outras explorações MARCGRAVE realizou, não é possível dizer; mas, mesmo que não tivesse feito outras mais demoradas, não lhe faltou ensejo para estudar a história natural, pois bastava-lhe sair da cidade, ou do acampamento, para logo se ver cercado de plantas e animais novos e até então desconhecidos do mundo científico.Não se deve, supor que pelo fato de serem as florestas facilmente acessíveis e próximas dos acampamentos, fosse também fácil ver e, muito menos, colecionar os animais que as habitavam.Todos os exploradores e naturalistas, nas selvas do Brasil, têm acentuado o fato de se poder viajar horas e, mesmos dias, por dentro das matas, sem jamais ver ou ouvir um só pássaro ou animal.Isto é, naturalmente, devido à vegetação muito densa e ao fato de que a maioria dos habitantes das I matas vivem nas árvores e só são encontrados a grande altura sobre as copas das mesmas.A maravilha é que MARCGRAVE, no estado selvagem e agitado em que então se achava o país e, com os parcos conhecimentos que possuía dos hábitos dos animais procurados, houvesse reunido tão valioso material.Que não deixava passar ensejo de aumentar as coleções e observações, é fora de dúvida, sendo provável que, tendo-se aclimado e lançado as bases do estudo da fauna e da flora do Brasil, os anos de 1641-44 lhe hajam corrido com muito maior atividade científica do que os três anteriores.Finalmente, em maio de 1644, chegou a época em que, paralisados os trabalhos com os preparativos de seu chefe para voltar à Holanda, deliberou regressar à Europa.A este respeito, o ignorado colaborador de MANGET é muito explícito, tanto que nos parece bem citá-lo por extenso: "SAMUEL KECHELIUS, astrônomo distinto, que lecionou, por muitos anos, em Leyden e foi anteriormente companheiro de MARCGRAVE, falou-me de cartas dele recebidas do Brasil, em que lhe anunciava já ter acondicionado todas as suas coleções e aguardar vento favorável para, "mercê de Deus, poder voltar à terra natal com o famoso Príncipe (MAURÍCIO) ". Mas, apesar deste propósito e inesperadamente, refere ainda KECHELIUS (e alguns outros o mencionam igualmente), foi enviado à Angola, na África, com intuitos que ignorava. acabara de ali chegar, faleceu."Assim morreu e baixou ao túmulo, na idade de trinta e quatro anos, no zênite de sua atividade e nomeada, GEORGE MARCGRAVE que, se tivesse vivido mais alguns anos para coordenar as suas coleções e observações brasileiras, certamente ter-se-ia elevado ao posto de primeiro naturalista de seu tempo, e talvez o maior depois de ARISTÓTELES" comenta GUDGER. Os frutos científicos da expedição científica ao Brasil determinada pelo Conde JOÃO MAURÍCIO e recolhidos por PISO e especialmente MARCGRAVE, são de quatro naturezas observa o professor de Greensbo-ro: a) os MSS. astronômicos e matemáticos de MARCGRAVE; b) as copiosas coleções de história natural; c) os MSS. de MARCGRAVE e de Piso relativos à história natural e à matéria médica do Brasil, e d) as duas séries de desenhos de plantas e animais do Brasil, uma a óleo outra a aquarela.Em relação às coleções de história natural que MAURÍCIO DE NASSAU trouxe do Brasil, informa LICHTENSTEIN que, além do material coligido por MARCGRAVE em suas explorações, enviou o Príncipe expedições a Leste, à África, e a Oeste até ao Pacífico. Desta procede o artigo de MARCGRAVE sobre os Chilenos com o célebre desenho do lhama. Delas resultou grande material de história natural. Para o conservar converteu o Conde a Freiburg em museu e os terrenos vizinhos em parque botânico e zoológico. (VAN KAMPEN).Quando, finalmente, o ilustre patrono das ciências naturais deliberou regressar à Holanda, despojou o palácio e os seus terrenos de todos aqueles tesouros tão copiosos e "os mais ricos que jamais trouxera um navio à Europa".Afirma LICHTENSTEIN ter o Conde com eles suprido o próprio museu, os de duas universidades (sendo Leyden uma delas) e ainda várias coleções particulares (MARTIUS menciona especialmente a de Seba).Tamanha a abundância deste material de história natural que ao cabo de cem anos, ainda não fora possível classificá-lo todo!Que tais coleções haviam sido, principalmente, obra de MARCGRAVE, parece mais do que provável. Como índice do cuidado com que conservava os espé-mes e do valor que consequentemente adquiriram, existe positiva citação de MANGET:"SAMUEL KECHEMUS viu vender, em Harlem, por 4.000 florins, um livro de insetos secos do Brasil, cujos nomes se achavam escritos por letra do próprio punho de MARCGRAVE".

Capítulo viiSinópse dos trabalhos astronômicos de marcgrave realizadaPor pingré. - o eclipse solar de 1640. - os eclipses lunares. - asObservações de mercúrio e de vênus. - depoimento de barlaeus. astrónomos e astrólogos.As primeiras observações astronômicas de MARCGRAVE que vieram a público, apareceram em 1658 com a edição de Piso. Cremos porém que o primeiro exame concatenado de seus manuscritos seja o devido a PINGRÉ, no século XVIII em suas Annales célestes du diz septième siècle, ? aliás inéditos até 1901, quando o ilustre BIGOURDAN os imprimiu sob os auspícios da Academia das Ciências do Instituto de França.Examinemos porém as preciosas referências do astrônomo francês setecentista, que teve em mãos os manuscritos do sábio de Liebstadt:Falando do eclipse lunar de 20 de dezembro de 1638 refere que "MARCGRAFF na nova cidade de Maurício, na ilha de Antônio Waas (sic) no Brasil observou o começo do fenômeno, determinando a altura de Procion sobre o horizonte. Fixou a imersão, a emersão, o final, tendo tomado a altura das estrelas com um quadrante de um pé apenas de raio. Seu observatório não estava ainda construído nem montado como se acharia em setembro de 1639, segundo declaração inscrita no texto manuscrito de MARCGRAVE".A tal propósito esclarece BIGOURDAN: "uma cópia do manuscrito de MARCGRAFF acha-se no arquivo dos Mapas, Cartas e Diários da Marinha. Parte se encerra no manuscrito autógrafo de BOULLIAU. Hoje (1901) estes dois manuscritos se encontram no Observatório de Paris".ISMAEL BOULLIAUD, (1605-1695), foi um dos mais infatigáveis polígrafos e eruditos de seu tempo. afamado como geômetra, astrônomo, historiador, ju-risconsulto, teólogo e literato. Mas aparelhado insuficientemente, por falta de recursos pecuniários, conta PlNGRÉ, suas observações astronômicas não tiveram a precisão das de AUZOUT, PICARD, CASSINI, DE LA HIRE, embora fosse homem de grande talento como demonstrou abundantemente. Sobretudo em sua dissertação sobre o movimento elíptico dos planetas em que "decèle un vrai génie", no dizer do mesmo PlNGRÉ.Tal o valor do copista dos manuscritos de MARC-GRAVE. Voltando ao exame da contribuição marcgra-viana, diz PINGRÉ que o astrônomo de Pernambuco observou em 1640 o eclipse solar a 12 e 13 de novembro,