caldo não sendo agitado, não se coagula. Ficando frio vai-se coagulando; em seguida é levado à casa chamada, Casa de purgar, onde é colocado sobre esteios paralelos em forma de bancos dispostos horizontalmente, dotados de uns buracos redondos. Abre-se o buraco, que fica debaixo da fôrma, para que se dê a última purificação ao açúcar, pela destilação de um suco escuro, chamado mel, que é recebido em canais pelos quais são transportados a um grande depósito chamado, Tanque de mel. Para que se realize esta última purificação, as fôrmas são cobertas por uma tampa, em forma de mesa redonda, fabricada de lodo, chamado Barro e umedecido com água fria; sem isto nunca ficaria,claro o açúcar. O número das fôrmas que se podem encher diariamente sobe de vinte até setenta.O açúcar assim purificado é tirado das fôrmas, o que se consegue facilmente, virando-as para baixo e agitando-as; assim cai a peça inteira de cor alvíssima, sendo, porém, a parte inferior de cor vermelha escura; esta parte se tira e se chama açúcar mascovado; às vezes encontram-se peças totalmente brancas. Os tijolos de açúcar são transportados a um tablado, feito de vigas para esse fim, onde são batidos com varas. Depois de expostos ao calor do sol, são colocados em cestos de madeira; aí são bem socados com pás de madeira, para que estes cestos fiquem bem repletos; em seguida tirado o opérculo, são sustentados por cravos de ferro. Cada tijolo de açúcar pesa de 30 e 42 libras; cada arca pode conter 20 a 30 arrobas, pesando cada uma 32 libras portuguesas, ou 30 holandesas. A diferença de qualidade do açúcar procede já da natureza do terreno, onde é plantado a cana; ou já do prefeito do açúcar, cuja ciência e felicidade muito influe no valor do açúcar. Quanto ao forno, em que se ateia o fogo para condensar o líquido sacarino, ele é amplo; tem quatro ou mais entradas amplas, por onde se lança a lenha, sendo grande a quantidade, que se consome; o fogo deve ficar ateado de dia e de noite, enquanto é movido o engenho para espremer a cana. Há uma espécie inferior de açúcar, chamado "Panela" e uma ínfima chamada "Ratão"; a respeito deles o autor não fez observação alguma.CAPÍTULO XVII Das mesmas canas e do fabrico do açúcar, entre os espanhóis, conforme Fr. Ximenes. Embora estas canas, diz ele, não sejam próprias ou domésticas das Canárias ou da Hespaniola, muito menos da Nova Espanha, mas peregrinas e estrangeiras a estas províncias, contudo por haverem sido encontradas, nas Canárias, não pareceu fora de propósito, tratar delas aqui, porque propus escrever acerca de todas as plantas medicinais, encontradas nestas províncias.Estas canas nascem em lugares quentes, junto das planícies e baixos da grande Canária, em solo fecundo e úmido. Devem ser cultivadas com todo esmero; devem ser regadas três ou quatro vezes, cada oito dias; devem ser mudadas e desembaraçadas de ervas malignas. No espaço de dois anos adquirem o justo tamanho, que raramente excede à altura de duas braças e meia; por dentro se enchem de uma sólida polpa, da qual emana o açúcar; tem muitos nós intermédios, da raiz ao ápice, no intervalo de cerca de nove dedos transversais. As folhas são maiores e mais verdes do que as demais canas; propagam-se pelas mudas ou rebentos, enterrados na gleba. Quando começam a aparecer chamam-se Plantae; depois de arrancados brotam novamente, no espaço de meio ano, até uma conveniente altura, tendo então o nome de Coca; depois de um ano, novamente são colhidas, recebendo então o nome de Recocae; que convém serem conservadas para constituir nova semente, porque se não forem tão férteis as canas para a produção de açúcar suficiente, ao menos sirvam para a propagação no quarto lugar. São moídas as canas nas máquinas, denominadas Ingenios ou moinhos nos quais se acham justapostos dois grandes eixos; depois que as canas se acham cortadas e divididas são espremidas num prelo a maneira de lagar. O líquido emanado corre por um canal para ser lançado a um vaso, denominado Tanque, onde é transfundido a um caldeirão vulgarmente chamado Recevidor; a este licor, denominado Mel, acrescentam duas grandes colheres (Bombas) de lixívia forte preparada para esse fim; ferve-se depois a fogo lento, até que o vaso receptor se encha novamente, segundo o tamanho do caldeirão. Com cuidado é purificado de toda impureza; em seguida é lançado a outros caldeirões, nos quais é fervido até completa purificação, batendo-se pouco a pouco a lixívia até que a espuma se eleve. O líquido já condensado à maneira de
História natural do Brasil.
Escrito por Marcgrave, Jorge e publicado por Museu paulista. Imprensa Oficial do Estado