História ou Annaes dos feitos da Companhia Privilegiada das Indias Occidentaes desde o seu começo até o fim do anno de 1636.Vol. 30

Escrito por de Laet, Joannes e publicado por Officinas Graphicas da Bibliotheca Nacional

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em seco de maré vazia. Entendeu pois o almirante que acertado era retirar ao presente os navios tomados, empresa que bem via ter suas dificuldades, porquanto os nossos haviam remontado a angra, segundo o sou calculo, cousa de quatro léguas, e a mesma angra corria dando voltas e fazendo muitos seios; demais que, sendo o inimigo senhor dos lugares adjacentes, era de recear que empecesse os nossos quanto pudesse. Ao outro dia (13 de Junho), estando a nossa gente ocupada em toar os navios, aconteceu por infelicidade adernar a caravela e arrebentar-se, de modo que nada puderam salvar. Ao seguinte dia mandou o almirante que descessem alguns bateis para observar que obras fizera o inimigo, durante a estada dele almirante na angra: os destes bateis, sendo chegados abaixo da entrada, notaram que o inimigo metera no fundo o navio, que os nossos esbulharam e largaram no dia 11, com o que estorvaram bastante a saída; mas este empecilho podia ser removido, queimando-se o dito navio na baixa-mar. Levantara mais o inimigo um parapeito junto a um monte e à borda de água, por traz do qual postara mosqueteiros cm não pequeno numero, fazendo conta que deste modo tolheria a saída aos nossos, pois tinham de passar por junto de dito parapeito. Informado o almirante destas ocorrências, se foi sem detença ao navio afundado, e por ser na baixa-mar mandou pôr-lhe fogo em dois ou três lugares. No entretanto ia atirando vivamente contra os nossos o inimigo, que se achava postado por traz daquele montezinho, sendo correspondido pelo fogo dos nossos falconetes de bronze postos nos bateis, de modo que puderam os nossos voltar acima sem grande perda. Tanto que tornou o almirante aos seus iates e navios tomados, ordenou que lhe levassem todos os couros, que encontrados fossem nos navios apresados para o efeito de forrar estes, bem como os iates e particular-mente os bateis, e assim segurá-los das balas de mosquete do inimigo, pois, como o vento era contrario, e o rio estreito e de poucas águas, impossível era saírem os navios a não ser por meio de ancoretes de espiar, que os bateis levariam adiante. Bem mau aspecto tinha este negocio, e dava tratos ao juízo, mas o almirante não era medroso, nem homem a quem faltassem expedientes, ou que deixasse de fazer as coisas com bravura nas ocasiões difíceis, quando mil outros houveram estacado perplexos. No entretanto o Governador da Baía, juntamente com muitos oficiais principais, todos os soldados e muitos paisanos da cidade que saíam manejar o mosquete, se viera postar atrás daquele parapeito, firmemente persuadido de que ali lhe cairiam na armadilha o nosso almirante e seus navios, e que nele vingaria os passados e ainda recentes danos e gravames, que lhe causara o mesmo almirante, Achando-se ao presente dispostas todas as cousas, e bem forrados de couros os bateis do lado que ofenderiam os tiros do inimigo, e colocadas algumas peças na ponte do iate Vos (igualmente resguardado com couros) para poderem atirar convenientemente contra o parapeito, ordenou o almirante que os dois navios tomados; bem como o barco que estava também cheio de açúcar, despejassem o rio. A 15 chegaram à boca do rio, e conquanto o inimigo fizesse do parapeito, por junto do qual tinham os nossos de passar, um continuo e bem nutrido fogo contra os bateis, que rebocavam os navios, foram