junto ao rio Ceará, ao qual denominaram de Ceará, cuja guarnição era composta de apenas 30 ou 40 homens e tendo como finalidade precípua antes cultivar as boas relações com os brasileiros, muito numerosos naquelas paragens, e, portanto, capazes de nos prestar excelentes serviços em tempo de guerra, - que assegurar a defesa da região. Com esse propósito em vista, o Grande Conselho sempre recomendou aos oficiais do forte que incentivassem a amizade dos silvícolas, enviando-lhes, freqüentemente, pequenos presentes. Contudo essa política não deu os resultados que dela se esperavam, pois, em 1644, vários dos nossos foram massacrados pelos nativos em Camocim, a cerca de 20 ou 30 milhas 1 de Ceará, como mais adiante veremos.
Em 1640, 2 a população aborígine de Ceará aumentou consideravelmente. Foi, de fato, tão grande esse aumento que as aldeias não podiam suportá-lo sem graves inconvenientes. Por outro lado, o Rio Grande se achava quase deserto e, portanto, incapaz de fazer face a um eventual inimigo. Assim, André Vlijfs propôs ao Grande Conselho fundar uma aldeia no Rio Grande para lá se instalarem os habitantes de Ceará que o desejassem fazer, tornando-se ele o chefe da povoação. Inteirados, o Conde Maurício e o Grande Conselho, das aspirações de alguns habitantes de Ceará, desejosos de se estabelecerem no Rio Grande, sua terra natal, e, tendo em vista os benefícios que para a Companhia poderiam resultar da migração desses brasileiros para ponto tão próximo, atenderam a sugestão de Vlijfs. Concederam-lhe ainda autorização para que trouxesse para a nova aldeia - da qual seria ele o chefe, ou capitão - o número de brasileiros que julgasse conveniente. Tomadas essas providências, escolheram-se, com a aprovação dos diretores da Companhia, certos chefes ou cabeças das mais antigas famílias de cada distrito, chamados Regedores pelos portugueses, bem como alguns juizes. Assim é que de Goiana veio Domingos Fernandes Carapeba, da Paraíba Pedro Potí, e do Rio Grande Antônio Paraupaba. 3 Entretanto, a despeito de tudo isso, os brasileiros de Ceará se rebelaram contra os holandeses, em 1644, atacaram de surpresa a guarnição do forte, a qual foi inteiramente trucidada em companhia de seu comandante, Gideon Morris, 4
- Twee Verscheyden I Bemonstrantien I ofte Vertogen, / Overgegeven / Aen hare Ho: Mo: de Heeren Staten I Generael der Vereenighde Neâerlanden. I Door Anthonio Paraupaba, / In zyn leven geweest Regidoor vande Brazilianen I inde-Capitania van Rio Grande: Ende met het laetste onge- / luekigh verlies van Brazyl, vande gantsche Braziliansche I Natie afgefonden; aen hare Ho: Mo: om derselver Natie I erbermelijcken en jammerlijcken toestant to vertonen, / ende met eenen hulpe ende bystant te versoecken. /Vs Graven-Hage, I Gedruckt by Etenricus Hon-dius, woonende inde Hosftraet, inde nieuwe Kunst en-Boeck-Druckery. 1657. I !f° - Tradução: "Dois protestos ou Memoriais entregues aos Altos e Poderosos Estados Gerais por Antônio Paraupaba, Regedor dos Brasileiros na Capitania do Rio-Grande, junto com a última e infeliz perda do Brasil; enviado por toda a nação brasileira aos Altos Poderes para mostrar o estado miserável e digno de piedade daquela nação e requerer, ao mesmo tempo, ajuda e assistência." 20 pp. Seeckere I Remonstrantie / Aen hare hoogh Moghende de Heeren Staten Gewrael der Vereenighde I Nederlanãen I overgegeven I Door / de gesainentlijeke aen-wesende gedeputeerdens / uyt Brazyl I Genderende tot behoudenisze van die Glo j rieiise Konincklijcke Conquesten. / Ams. MDCLVII. - Tradução: "Súplica aos Altos Poderes os Estados Gerais das Províncias Unidas; entregue por todos os deputados brasileiros presentes, considerando a guarda dessa gloriosa e real conquista." 8 pp. Sobre a viagem de Pedro Potí à Holanda, consulte-se a Declaration de Gaspar Paraoupaba, de Siara, âgé de 50 ans, d'Andreus Francisco, de Siara, âge de 32 ans, de Pieter Poty, de la baie de Traiçaon, á"Antony Guirawassauay, d'Antony Francisco et Lauys Caspar, tons de Ia baie Traiçaon, un desquels de La nation des Tiguars de La cote septentrionale du Brésil. Notée par le sieur Kilian de Resenlaer le 20' mars de Van 1628, à Amsterdam, p. 9. Publicada nos Anais da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro em 1907 e também na Revista Trimensal do Instituto do Ceará, 1912, tomo XXVI, Fortaleza, p. 9-14. Sobre cartas trocadas entre alguns índios, como A. F. Camarão, Diogo da Costa, Diogo Pinheiro Camarão e a resposta de Pedro Potí, consultem-se: As cartas tupis dos Camarões, de Teodoro Sampaio, vol. XII, n. 68, p. 287, onde são traduzidas para o português duas cartas; a primeira, de Diogo Pinheiro Camarão e a segunda de Diogo da Costa, ambas dirigidas a Pedro Potí. Foram escritas em 1645 e já haviam sido traduzidas para o holandês pelo padre reformado Johannes Edwards. Souto Maior, no referido trabalho sobre "Dois índios notáveis e parentes próximos", traduziu do holandês uma carta de Pedro Potí, dirigida ao Capitão Antônio Filipe Camarão e outra de Filipe Camarão aos índios aliados dos holandeses.
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Nota 157: O tradutor inglês escreveu: "cerca de 30 léguas", (cf. p. 44, 2a coluna,1a § da edição holandesa e p. 30, 2a coluna, 2° § da tradução inglesa).
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Nota 158: O tradutor inglês escreveu 1641 (cf. p. 44, 2a coluna, 1° § da ed. holandesa e p. 30, 2a coluna, 3° § da trad. inglesa).
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Nota 159: A bibliografia sobre estes índios é curiosa, embora pouco extensa. Pedro Potí foi à Holanda em 1625, na esquadra de Hendrikson e lá ficou até 1630. Voltou em 1631, provavelmente com Lonck; em 1645, foi eleito regedor dos índios da Paraíba. Na segunda batalha de Guararapes, a 19 de fevereiro de 1649, foi preso. Morreu em 1652, a bordo do navio que o levava para Portugal. Antônio Paraupaba foi, em 1633, intermediário entre Janduí e Arciszewski e Stachouver. Em 1645, foi igualmente eleito regedor dos índios do Rio-Grande. A 6 de agosto de 1654, foi enviado à Holanda, morrendo em 1656 ou 1657. Sobre esses dois índios, consultem-se os seguintes trabalhos: Dr. "Guilherme Studart, Dicionário Bibliográfico do Ceará, 1913; Fortaleza, vol. II, pp. 16 e 17- - Pedro Souto Maior, Dois índios notáveis e parentes próximos. Rev. Trimensal do Inst. do Ceará, tomo XXVI, 1912, p. 61-71. - Pedro Souto Maior, A missão de Antônio Paraupaba ante o Governo Holandês, Rev. Trimensal do Inst. do Ceará, tomo XXVI, 1912, p. 72-82. Antônio Paraupaba, quando esteve na Holanda, apresentou ao Governo Holandês dois Memoriais e uma Súplica:
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Nota 160: Gideon Morritz ou Morris de Jonge como escreveu Barlaeus (VII, 249 e 369), e como consta nas cartas e relatórios assinados, foi um aventureiro flamengo, prisioneiro no Amazonas, detido oito anos no Maranhão. O papel que representou na história da colonização do Ceará e a influência que exerceu, junto aos Diretores da Companhia das índias Ocidentais, para a conquista do Maranhão, tornaram-no a figura central do movimento expansionista holandês no norte do Brasil. A importância da conquista do Maranhão que asseguraria pelo lado norte a posse das capitanias já conquistadas, pleiteada e defendida por Gideon Morris de Jonge, demonstra sua visão e perspicácia política e econômica. A 22 de outubro de 1637 apresentava, em Middelburg, o primeiro relatório sobre o Maranhão e sua conquista. O segundo foi apresentado em 3 de fevereiro de 1640, com a colaboração de Johan Maxwell, que, prisioneiro no Maranhão, atendera a um mineiro espanhol que adoecera após a viagem de Quito ao Amazonas, gozando, por isso, de grande reputação e, assim, podendo obter excelentes informes sobre as minas do Peru. Esse segundo relatório é o mais longo, pois nele referem-se as peripécias da viagem de Quito ao Amazonas, e a possibilidade de se alcançarem as ricas minas de Potosí. A 23 de novembro de 1640, partia do Recife para o Ceará, como "commandeur" de índios, enquanto Johan Maxwell, a 21 de janeiro de 1642, era indicado para "commandeur" de índios no Maranhão. Em abril de 1642, escrevia Gideon Morris de Jonge explicando as razões por que a conquista do Maranhão não correspondera à expectativa dele. Em carta de 12 de junho de 1643, o Supremo Conselho expunha aos diretores da Companhia a situação do Maranhão, declarando que confiara a Gideon Morris o posto de sub-diretor, com o encargo do trato com os índios. Realmente, em 20 de julho de 1643, Bas deixava o Maranhão entregue a Wiltschut e Gideon Morris. Foi ao Ceará e, em fins de 1643, lá se encontrava, sendo, pouco depois, vítima de uma invasão de bárbaros que igualmente arrasaram as obras feitas nas salinas vizinhas de Upanema, por ele descobertas. Foi, realmente, uma curiosa figura de aventureiro, e, de certo modo, pode-se afirmar que foi muito perspicaz na seleção geográfica dos terrenos onde exercer domínio político; pois era mais inteligente, parece-nos, a expansão para o Norte do que para o Sul, tentada por Brouwer. Sobre suas cartas e relatórios, ver XXXII, 237-319; I, 127-8, p. 430, nota IV de Rodolfo Garcia e LXXVII, 120, 121, 122.
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