Historia Natural Médica da Índia Ocidental

Escrito por Piso, Guilherme e publicado por Ed. Itatiaia. Ed. Universidade de São Paulo

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até necessário à erva e aos pastos, para que no verão não se queimem pela carência das chuvas. E por ele só se revigoram os sítios áridos e faltos de água. Nada é mais alimentício do que o orvalho; dele só vivem tantos animálculos como inúmeros insetos. Já o dizia o divino poeta: 1 "Quanto o orvalho restaura de noite". É de eximia eficácia o orvalho matinal, revigorador admirável dos gados e homens, que sofrem com o calor, e dos alquebrados pela efusão dos espíritos. Pois, concentrando o calor nativo, reforça-o, abre o apetite e além disso provoca a urina.Em diversas ocasiões os ventos etésios ou anuais, muito serenos, bafejam estas regiões. No semestre hibernal ou chuvoso, projetam-se da região meridional nebulosa e assumem quase a natureza do Sudoeste Eles dominam nos meses estivais mais violentamente que o Norte, e conseguem o império do ar, tanto que também o movimento das águas lhes obedece, desde março até outubro. No resto do ano os mares são varridos do norte para o sul. Sucede o contrário no lado ocidental da África, oposto ao Brasil. De abril a julho, o fluxo é rápido em direção ao Norte; dai até outubro, o mar fica tranqüilo. De então até janeiro, o oceano é impelido com força para a região meridional; e a seguir, nos meados de abril, de novo, os marinheiros não experimentam nenhuma corrente marítima (como Verulâmio 2 chama aquele fluxo geral) . Estas diferenças são particularmente percebidas pelos navegantes em mar alto, dentro dos trópicos. Estes ventos gerais, denominados tropeus, nada morosos, em parte regendo a corrente marítima em parte pelo próprio sopro (não por algum espontâneo impulso do nascente ao poente, como Scaliger e antes dele alguns antigos imaginavam) fazem que os que navegam para as plagas da África ou da Europa não possam voltar pelo mesmo caminho por onde tinham vindo.O mar brasileiro em geral é tranqüilo. Os temerários bárbaros, metendo-se por ele em dois paus de natureza suberosa, a Jangada, praticam com segurança a pesca, afastados algumas léguas do litoral. Sua superfície é exteriormente de cor cerúleo-negra, verde no interior. De noite, agitado, cintila e refulge com grande brilho. Aqui é mais salgado que para os


  1. Nota 29: Vergílio, G. 2, 201-2, que o nosso autor resumiu: Et quantum longis carpent armenta diebus. Exigua tantum gelidus ros nocte reponet.

  2. Nota 30: Francisco de Verulam Bacon (1561-1626). Chanceler-mor ao tempo do rei Jaime I. Autor de obras nota bilíssimas, entre as quais Novum organum.