História dos feitos praticados no Brasil, durante oito anos sob o governo do ilustríssimo Conde João Maurício de Nassau.

Escrito por Barleus, Gaspar e publicado por Fundação de Cultura do Recife

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dos engenhos. Hoje, porém, pela escassez e carestia dos negros, são empregados também noutros afãs, e não os sabendo, antes querem fugir perfidamente que fatigar-se com o trabalho. Muito inclinados a guerra, temem procurar com o suor o que preferem procurar com o sangue, não tendo nenhum escrúpulo de desertar de suas parcialidades e bandeiras. Sempre que se fazem levas nas aldeias, escapolem-se antes de ser intimados. Sujeitam-se com dificuldade a mesma disciplina dos nossos, recebendo soldo menor. São terríveis para os inimigos, não tanto pela força quanto pela fama de ferocidade. Perseguem acérrima e ferozmente aos fugitivos. A ninguém perdoam a vida.

Zelo do predicante Davílio para converter o gentio

Muito remissos em matéria de religião, aprenderam com os católicos as orações cristãs, a Oração Dominical e o Símbolo dos Apóstolos, ignorando tudo mais. O predicante Davílio, para instruir aquela gente ignorante nas coisas divinas, aprendeu-lhe a língua, fixou-se no meio de suas aldeias, ensinou a infância, arrancou-os ao paganismo com o santo batismo da Igreja Reformada e casou-os segundo o nosso rito. Atualmente, nas aldeias de Alagoas, Una; S. Miguel, Goiana, Paraíba e Rio Grande, poder-se-ão achar 1.923 homens idôneos para a guerra, sendo mais do triplo o número das mulheres. Dos homens poderão separar-se 1.000 para a milícia, deixando-se aos velhos o cuidado das famílias. Ê comum irem as mulheres com os maridos para a guerra, dispondo-se para a mesma sorte deles, tanto de vida como de morte.

Escravos.

Dos escravos uns são índios, outros africanos e outros trazidos do Maranhão. Já antes compraram os Portugueses escravos índios cativados pelos tapuias, ou reduziram a escravidão, por se terem aliado a nós, os que abandonara, na baia da Traição, o almirante Balduíno Henrique. Todos foram já libertados. Os maranhenses comprados como escravos pelos Portugueses aos seus cativadores, mantivemo-los no estado servil, por não lhes devermos nenhum beneficio. A terceira classe de escravos são os africanos, dos quais são os angolas os mais trabalhadores. Os ardras, muito preguiçosos, teimosos e estúpidos, tem horror ao trabalho, com exceção de pouquíssimos, que são mais caros por tolerantíssimos do serviço. Os de Calabar tem pouco valor em razão de sua preguiça, estupidez e negligencia. Os negros da Guiné, os da Serra Leoa e os do Cabo Verde são menos próprios para a escravidão, porém mais polidos, mostrando mais gosto para a elegância e para os enfeites, principalmente as mulheres. Empregam-nos por isso os Portugueses nos serviços domésticos. Os do Congo e do Sonho são os mais aptos para