a qual, assim como nos furtou ao inimigo, assim também furtou este a nós. Desabaram, com efeito, tão violentos temporais que, numa só noite, doze naus, perdendo as âncoras, abalroaram umas com as outras com o maior risco e não sem perigo de naufrágio.Em conseqüência sabendo o nosso general que aos votos dos comandantes nem sempre correspondem os eventos das guerras, e que nem sempre os desígnios divinos se sujeitam aos dos homens, dividido muitas vezes o império de Deus com o de César, examinou rigorosamente, com o conselheiro Gisselingh e outros comandantes de terra e de mar, o aspecto da presente guerra, o estado dos acampamentos e todas as circunstâncias da empresa, concluindo o seguinte: que desfalcado o exército, restavam apenas, aptos para a luta, 2.400 soldados e 900 brasileiros; que com tais forças, não era possível nem a própria defesa, nem o ataque contra os inimigos, protegidos por diversos fortes e trincheiras, nem impedir o transportarem para a cidade as coisas necessárias; que as fortificações deles holandeses estavam expostas ao inimigo, postado nas partes mais altas, resultando daí a certíssima dizimação dos mesmos; que a quadra chuvosa do ano era a pior geradora e alimentadora de doenças entre eles, já tendo morrido João Wendevile, capitão da guarda do Conde, e bem assim o capitão Israel Twyn e diversos soldados rasos; que, dia a dia, rareavam as fieiras, sem haver socorros às mãos, enquanto para os adversários crescia a força e o exército, porque de toda a parte eram os indígenas convocados às armas, conforme evidenciavam as seus desertores e as cartas interceptadas; que tinha o governador nas guarnições 2.000 infantes, parte portugueses, parte castelhanos; que o Conde Bagnuolo trouxera em auxílio 1.400 e mais 800 brasileiros; que se calculavam em 3.000 os cidadãos em armas, entrando nesta conta até eclesiásticos e estudantes; que ademais, tinha ele duas companhias de cavalo, além de escravos negros e mulatos e gente trazida dos campos, todos providos de armas; que se pode mais facilmente defender com muitos o que se possui do que expugná-lo com poucos. Além disso, levou-se em consideração no conselho que, por inútil demora no território inimigo, se iria sacrificar a força principal da milícia brasileira, tornando-se patentes às ciladas e assaltos dos contrários as nossas possessões em outros lugares, resguardadas por módicas guarnições; que convinha escolher antes os expedientes cautelosos pelo conselho do que os prósperos pelo acaso, não merecendo a aprovação dos homens prudentes a pertinácia dos planos desesperados. Prouve, portanto, a
História dos feitos praticados no Brasil, durante oito anos sob o governo do ilustríssimo Conde João Maurício de Nassau.
Escrito por Barleus, Gaspar e publicado por Fundação de Cultura do Recife