História dos feitos praticados no Brasil, durante oito anos sob o governo do ilustríssimo Conde João Maurício de Nassau.

Escrito por Barleus, Gaspar e publicado por Fundação de Cultura do Recife

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para executar seu desígnio, recuperou-a sem dificuldade, graças à traição do português Sebastião do Souto, homem perfidíssimo, de cujo ótimo auxílio nos servíramos antes. Ilaqueando com mentiras a boa fé do sargento Picard, nos causou mais desvantagens e danos do que as vantagens e salvação que nos deu. Com falsas indicações, aconselhou Picard a evacuar a fortaleza e entregá-la à invasão do inimigo, removendo-lhe a guarnição. Com esta proeza, celebrizou, pela enormidade do crime, a perfídia dos seus.Além disso, foi condenado à morte Domingos Calabar, português que, abandonando o partido do rei pelo nosso, foi preso no forte e supliciado, pagando na forca a sua deserção e deixando os membros esquartejados por espetáculo e testemunho da sua infidelidade e miséria.

Ordena os acantonamentos - Expugna o forte.

Julgando Nassau que interessava à Companhia sujeitar-lhe ao poder a dita fortaleza, estabeleceu logo quatro acantonamentos. Ele chefiou o primeiro, o governador Segismundo van Schkoppe o segundo, o coronel Artichofski o terceiro, e o almirante Lichthart o quarto. Livre do medo externo, levanta baterias em cada um dos postos, assenta a artilharia, e, jogando-a feroz e reiteradamente contra a fortaleza recebeu do adversário mútuos disparos e danos, ficando destruídas de parte a parte as trincheiras que a pressa levantara. Entretanto, com o trabalho dos sapadores, estende sem esmorecer os aproches e as minas, arrastando-se com os operários até perto dos soldados contrários. De sol a sol, era-lhes companheiro nos perigos. Morreram, além de alguns soldados rasos e oficiais, Carlos de Nassau, militar jovem e ardoroso, mais esforçado e brioso do que afortunado, e o capitão João Tallebon, arrebatados à prática de grandes atos de valor pela súbita explosão de uma bombarda. No décimo-terceiro dia do assédio, já estando as obras de acesso próximas dos fossos, e faltando aos sitiados coragem e forças para ainda se defenderem, rendeu-se a fortaleza com honrosas condições, primeira recompensa que o Conde alcançou da expedição americana, fundamento e caminho de um poderio mais amplo. Concedeu-se aos soldados da guarnição, armados segundo as praxes da milícia, a faculdade de partirem e retirarem-se de batida para a ilha do Recife a dali para a Hispaníola e para os lugares das Índias Ocidentais que escolhessem ou para a Ilha Terceira. Foi-lhes permitido, segundo as honras da guerra, levar um só canhão e alguma munição. Pediram a Nassau navios para a partida, com as garantias que tinham pactuado. Rumaram todos para a Ilha Terceira, que é a principal dos Açores ou Ilhas Flamengas.