História natural do Brasil.

Escrito por Marcgrave, Jorge e publicado por Museu paulista. Imprensa Oficial do Estado

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Antes, porém, deste rompimento, encontra-se dentro um caule elegante, que mede um pé de comprido e três ou quatro dedos de grossura. Este caule, se acha dividido em vários ramos de um pé ou pé e meio de comprido, que se acham tão bem dobrados numa teca, que aparentam uma espiga. Estes ramos se acham carregados de corpúsculos triangulares do tamanho de amêndoas; estes corpúsculos são brancos e constituem os rudimentos das flores e das nozes; rompida depois a bainha, estes ramos se estendem à maneira de arbustos e apresentam flósculos lúteos. Em seguida, vêm os frutos; cada qual adere a seu pedículo; tem a grossura de uma pena de pato, sendo constituído por uma cúpula de escamas vermelhas-amareladas. A noz menor é verde; indo amadurecendo, toma a cor amarela-pálida; totalmente madura, é de cor de madeira; sua figura é oblonga ou oval e quase triangular; mede às vezes de comprido dez, doze ou quatorze dedos; de grossura mede dois e mais pés. O fruto consta de um tegumento exterior; depois de uma casca em terceiro lugar, de um núcleo; enfim, de uma água. O tegumento externo é glabro; consta de filamentos um tanto grosso, longos, de cor avermelhada como ado linho, aparentando uma estopa de cânhamo grossa e crua; na parte, em que a noz adere ao pedículo, ele mede mais de dois dedos de grossura, no mais, só um. A casca é grossa como o crânio humano; na extremidade, em que adere ao ramo, se acham três poros, correspondendo a um núcleo, como o da cereja. (?) Na cavidade desta casca pu no seu âmbito interior, se acha aderente um núcleo, que, por sua vez, se acha coberto de uma película entre ele e a casca; é de cor vermelha, aparentando a noz-moscada. Estando madura a noz, o núcleo é da grossura de duas terças partes do dedo; é alvíssimo, repleto' de um suco lácteo, do sabor das melhores avelãs. Os núcleos de uma só noz é suficiente para saturar três na cavidade do núcleo, enfim, se encontra uma água; esta é escassa, quando o fruto está totalmente maduro e chegou à perfeição; não é agradável para se beber. Quando a noz está, porém, em meio termo, isto é, quando a casca começa a amarelar, a cavidade se acha repleta de uma água agradabilíssima para se tomar (contém uma pinta holandesa ou mais); é doce, fria e clara. Quando se encontra abundância desta água, o núcleo está mole e não é agradável; logo para se fazer uso da água, escolhe-se o tempo da imperfeita madureza; para se comer o núcleo, espera-se o tempo de perfeita madureza; a água serve para nutrição do núcleo. Do núcleo maduro se extrai um leite, com o qual se cozinha arroz para iguaria. Esta árvore contém, no alto, uma medula alvíssima, como um bolbo, porque pode facilmente ser separada em partes, como o alho ou a cebola; esta chama-se palma, em latim; sendo arrancada, logo morre a árvore, donde vem o provérbio, conseguir a palma. Esta medula é alvíssima, marchetada de pontinhos, como poros; suculenta, de sabor doce, melhor do que as melhores nozes; pode-se come-la crua, simplesmente, ou então com óleo e vinagre; pode-se também cozinhá-la. A árvore contém, o ano inteiro, flores e juntamente frutos verdes e maduros; gosta dos lugares marítimos e arenosos; junto dos vaiados e muros; no interior, raramente é encontrada; quando aí é plantada, não dá fruto, nem chega a ter o tamanho conveniente. Falarei agora sobre o modo de plantar e transplantar; (tudo conforme minha observação); não escreverei cousa alguma que não tenha visto e observado. O fruto inteiro ou a noz com a casca, enterrada levemente sob a terra ou somente lançado sobre a terra, germina, no espaço de sete meses; do germe a planta é transplantada, depois de um ano; depois de sete anos, finalmente, dá as premiças dos frutos. O modo de germinação é o seguinte: confiada à terra a noz com a casca, dos pequenos orifícios procede um germe filamentoso, tendo origem da água contida na noz; aquela água foi antes congelada numa substância esponjosa, alvíssima, constituindo a figura de uma noz para que daí procedesse o germe.O germe, quando brota, se acha coberto de um tecido como de cânhamo com três ou quatro folhas, unidas a si apertadamente, sem caule; ainda que chegue a seis, oito ou dez pés de altura somente consta de folhas e caules.Cada folha do arbusto ainda novo é íntegra, não dividida em asas, como nos velhos, mas dobrada como os mantos das mulheres, na Alemanha.Com o decurso do tempo, divide-se expontaneamente e formam-se asas; a árvore então adquire caule, debaixo da túnica de que se acha cingida, em baixo. Quando o germe brota da noz, logo, por todo o tegumento grosso, lança raízes filamentosas, amarelas, que perfuram o tegumento de um e outro lado e saem para fora (o comprimento é de um pé ou mais e a grossura iguala a da minhoca), enterrando-se depois na terra; passado certo tempo, a noz é consumida pela podridão. Se quisermos saber de onde recebe esta planta alimento, antes que suas raízes se fixem à terra, o que não se dá logo, direi: indiquei acima que procede da substância esponjosa um germe; desta substância e ao mesmo tempo do núcleo aderente à casca se nutre a arvorezinha, porque quanto mais depressa arrancarmos a árvore, antes que lance raízes à terra, tanto maior é o núcleo, que encontramos.A esponja adere tenazmente ao fundo do arbusto por meio de fibras, de sorte que pode ser tirada da ,noz, ficando o núcleo pendente.Os "fetos" * são transplantados ou não. Se quisermos transplantá-los, devemos fazê-lo, no primeiro ou segundo ano de sua idade, no mês de junho ou julho; podem também ser transplantadas mais antigos isto é, de quatro ou cinco anos, mas perece a maior parte.

[pagina 14 0]Vi todavia ser transplantado uns grandes, isto é de vinte e quatro ou mais anos com bom resultado, no ano de 1640, em Maurícia, sendo empregados neste trabalho cerca de trezenos homens. Da casca da noz fabricam-se excelentes copos. Nota. Desta mesma árvore assim fala Fr. Ximenes: entre as palmeiras, produtivas de cocos (Coyolli, na linguagem dos mexicanos) encontra-se uma árvore não muito grossa, porém alta, cujos ramos (melhor diríamos palma) sobresaem, no alto do tronco, erguidos em número de cinco ou seis, à semelhança das palmeiras da Espanha, totalmente verdes claras. Possue a árvore um tronco reto, cor de cinza, cingido desde a raiz até o alto de uns como pequenos degraus, com cujo auxílio os indígenas facilmente sobem ao cimo da árvore. O tronco é muito esponjoso gosta dos lugares marítimos, como se vê nas Filipinas, Porto Rico, principalmente junto às margens de Colínia e Zacatula. Sua flor se assemelha à da castanheira, o fruto iguala em tamanho à cabeça humana; é alongado, triangular, verde alegre, antes de ser cortado. A própria noz pode ser semeada e brota facilmente; transposta cresce e logo dá frutos, principalmente se é adubada com cinza ou estéreo bovino e regada cuidadosamente. Deita profundas raízes, não proporcionadas ao seu volume; o tronco é mais grosso, junto das raízes; quanto mais se eleva, mais fino se torna; constitue útil material para muitos usos. Nas Ilhas Filipinas, não só daquela matéria fazem navios, mas também os guarnecem com cordas, velas e outros aparelhos náuticos, feitos da mesma árvore, e o que é mais de admirar, carregam os navios de mercadorias originárias da mesma árvore, a saber, óleo, vinho, açúcar, frutas e outras cousas. Com efeito, ferindo-se os tenros ramos da parte inferior, procede um licor que serve de vinho; este a princípio é suave e de agradável sabor; depois vem a tornar-se insípido e quase inútil; sempre, porém, é de desagradável cheiro. Tomado com demasiada freqüência, produz humores grossos, flatulência e cruesas, embora aqueça e humedeça; é, porém, mais fraco do que o nosso vinho e perturba menos o cérebro, a não ser que se ajuntem outros ingredientes, como vulgarmente se faz. Dizem que convém aos tuberculosos e doentes dos rins, porque com esta bebida se purificam aquelas partes e são expelidas as areias; faz muito mal para os hidrópicos ou aos que estão com o baço obstruído. Aquele licor vinoso, exposto ao sol, ou conservado por oito dias, transforma-se em ótimo vinagre; que seca menos do que o nosso; sujeito à ação do fogo perde seu vigor, porisso, quando o deitam aos alimentos deixam que estes se esfriem. Dura muito tempo, mas corrompe-se logo, se lhe deitarmos um pouco de água. Do mesmo vinho fervido e mais espesso prepara-se mel e açúcar que é de natureza quente, húmido, de agradável sabor; conserva-se por longo tempo; é um lenitivo para o peito e útil contra ò reumatismo; corrobora o ventre e o cérebro; ajuda a digestão; finalmente pelo gosto não difere do nosso açúcar cândido. A noz recente e tenra tem o sabor do cardo, porém mais doce e menos adstringente; refrea a soltura, tira as cruezas e refocila o ventre. A casca que vem em seguida, denominado propriamente Coco é de cor preta e dura; dizem que é bom beber dele, sem dúvida corrobora os nervos e cura paralisia. Sob esta casca se acha encerrada uma medula cândida, de agradável sabor, rival das amêndoas doces; desta medula socada extrai-se um licor lácteo (sem emprego de fogo), o qual é de grande vantagem contra vermes intestinais, quando tomado pela manhã, em jejum, na quantidade de oito onças, adicionando-se-lhe um pouco de sal; convém principalmente aos meninos e jovens. Desta medula ralada, fervida nágua e agitada, emana um óleo que fresco serve para temperar os alimentos e é de uso medicinal; de natureza quente e úmida. Tomando-se a quantidade de seis ou oito onças, produz-se um brando efeito purgativo, sendo expelidos os humores melancólicos e pituitosos, embora digam que a própria medula prende o ventre; para purgar exige-se óleo fresco. Mitiga as dores oriundas de causa fria; é um ótimo remédio para curar feridas; estanca o sangue; purifica purulência e a seca. Frixionando-se o peito com este óleo, produz-se um alívio e limpeza; produz, enfim, este óleo inúmeros efeitos, que seria muito longo enumerar; principalmente serve para abrandar os nervos e acalmar dores pertinazes de gota. Também a água clara, como leite, que se acha na medula tem várias utilidades; cura febres, extingue a sede; abranda o calor; limpa, cura os olhos e consome a carne supérflua, que os costuma afeiar; dá uma elegante cor no rosto das mulheres; refresca e humedece. Além disso, purifica o sangue, o ventre e os uréteres; mitiga dores e é de agradabilíssimo sabor, principalmente para os febricitantes, os quais, embora suem muito podem bebê-la sem inconveniente, contanto que estejam em jejum; nutre, cura admiravelmente febres biliosas; embora se acredite que produz flatulência, contudo pode-se tomá-la em dias de purgação; os que têm, porém, o ventre muito relaxado, devem abster-se desta bebida. Do mesmo modo que a palmeira da África ou Algarves, possue rebentos ou brotos suaves, que dificilmente podem ser cortados sem detrimento da árvore. Nem as folhas são inúteis; porque servem para se coar o vinho, fazendo às vezes de coador; das mesmas se fazem também chapéus, esteiras e vários tecidos. Assegurou-me um religioso de nossa ordem, que muitos anos vivera nas Filipinas, que se encontram, em muitos cocos, na própria medula e e no suco lácteo, pedrinhas alvíssimas, de forma oval, um pouco achatadas de uma parte; estas constituem poderoso remédio contra nefrite e os que as trazem consigo ficam livres daquela doença e sentem alívio; aquele religioso trazia uma delas amarrada ao braço. Até aqui Fr. Ximenes.Muitos, além disso, escreveram acerca desta noz, que denominam indica; principalmente