História natural do Brasil.

Escrito por Marcgrave, Jorge e publicado por Museu paulista. Imprensa Oficial do Estado

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cultivada, há muito tempo, nas hortas. Julgamos valer a pena acrescentar aqui o que Fr. Ximenes disse a respeito desta planta. Os mexicanos, diz, dão o nome de Chilli à planta que dá silíquas, chamadas Axi, nas ilhas Hispaniolas e os antigos, como alguns pretendem, denominam Siliquastrum Hispani Piper Americanus e Actuarius Capricum. Esta planta, embora tivesse sido cultivada, há muito tempo, nas hortas da Espanha, não só para ornamento, mas ainda para condimento; contudo, como se observam, na América, várias de suas espécies e suas silíquas são tão usadas, que dificilmente se encontra prato em que não entre, e suas propriedades são conhecidíssimas, julgo não ser inútil descrevê-la e dar notícias das várias espécies, que vi. As folhas de quase todas as espécies são como as do Solanum. Quauhchilli com a exceção de terem as folhas menores. Produz flores cândidas, das quais procedem silíquas, no princípio rubras, depois como que tostadas, semelhantes à passa de uva; são repletas de uma semente pequena, subtil, cândida e umbonada; tem sabor picante e cáustico, de modo que é considerada quente, no quarto grau, e seca, no terceiro; produz um suco excrementoso, que finalmente é consumido. Daí vem que, excitando a flatuosidade, desperta a paixão venérea; desenvolve o ventre, mas não sem cólicas, principalmente naquele que não estão acostumados; e uso moderado constitue laxante brando (a causa disso parece ser a acrimônia). Desenvolve também a menstruação e a urina; corrobora o estômago (ventrículo) enfraquecido pelo frio; excita sobretudo o apetite um certo gênero falso de chilli misturado com tomates, mittomatl como denominam; elimina os humores pituitários de qualquer parte do corpo, principalmente os situados nas juntas das coxas, que soem gerar a ciática. Julgam os bárbaros ser remédio utilíssimo contra a tuberculose ferir o ventre e os rins com preguinhos ou alfinetes embebidos no chilli. Se alguém, porém, usa imoderadamente o chilli, fica sujeito à inflamação dos rins e do fígado, a dores nos rins, ao frenesi e hipoconchia, abcessos internos e outras enfermidades. É esta planta empregada pelos bárbaros como alimento ordinário; pelos espanhóis como condimento; nasce nos lugares quentes e frios; de modo melhor, em lugares temperados ou um pouco quentes. A primeira daquela espécie se chama, entre os mexicanos Quauhchilli como si disséssemos arbórea e na Hispaniolas onde a silíquas é menor e mais redonda do que o Axi da montanha ou caríbico. Esta espécie é a menor de todas; na forma e no tamanho é semelhante aos frutos do oleastrum e como todas as espécies quentes se acham, no quarto grau, esta é a mais quente e a mais cáustica de todas; porisso só serve para condimento, em lugar da pimenta; produz semente, o ano inteiro. A segunda espécie se chama Chiltecpin, porque na cor a figura se assemelha muito aos mosquitos, isto é, culex (em latim); outros lhe dão o nome de Totocuitlatl, que significa estéreo de aves pela cor e pequenez. Soube dos habitantes da ilha de S. Domingos que se chama huaratinac. Esta espécie embora pareça mais verde, contudo mais depressa perde seu verdor. Essas três espécies são classificadas pela diversidade dos lugares em que crescem e dos tempos em que são colhidas. A primeira é vulgar; a segunda semelhante a esta, com tendências para a cor preta, porisso se chama Tlilchilli; a terceira, a menor de todas, é semeada em setembro e dá frutos maduros de dezembro ao princípio de abril. A terceira espécie se chama Tzanalchilli. É semeada em agosto em lugares cultivados, quando cessam as chuvas; seu fruto fica maduro de novembro a março; a princípio é verde, depois torna-se vermelho. Na Hispaniola, é chamado Axi cândido. Quarta espécie chama-se Chilcoztli, por causa da cor crócea, que dá aos condimentos e alimentos a que se ajunta, porisso na Hispaniola se chama Acafran Axi; sua silíqua mede seis a sete dedos de comprido e mediocremente tênue tendo cor vermelha; algumas vezes, tostada. Quinta espécie. É chamada pelos mexicanos Tzinquahyio, porque é silvestre; na Hispaniolachama-se Axi coral por causa da forma e cor; a silíqua é tênue e mede de comprido cincodedos transversais; é semeada em março e dá fruto em quase todo o ano. . Sexta espécie. Chama-se Tzoncbilli, porque é mais branda; sua vagem é longa e larga e de cor rubra. A semente tem ardor mais brando, de sorte que é usada com papas de milho, chamadas Chillaquiles; oferece ótimo nutrimento, como atestam os bárbaros. Costumam espalhar essa espécie pela terra, para que se seque e assim se possa melhor conservar; de outra sorte facilmente se estragaria pelo excesso de humidade; é semeada e dá fruto o ano inteiro.Encontra-se uma outra espécie, chamada Milchilli, cuja silíqua não é menor do que as precedentes, mas vai-se afinando e termina em ponta. Sua cor é áurea; é colhida nos mesmos meses de colheita do milho. Além disso, outras espécies são observadas na ilha Hispaniola, entre elas a conhecidíssima, que tem silíquas como a cereja, do mesmo formato e tamanho. Nasce como arbusto e é chamada por alguns Struchnodendron, por outros Speudocapsicum e pelos espanhóis cereja azeda da América. Há ainda uma outra, cuja silíqua é denominada bico de noz de pinha ou bico de ave, porque tem a figura de ambos; chama-se babora ou baniasan corniculata ou cazicar hortense. Há outras que, por brevidade, não menciono; fico satisfeito em ter falado das principais. Estas cousas diz ele. A semente desta planta é tão acre, que se deve tomar cuidado, para que não se toquem os olhos com as mãos, impregnadas delas; por isso julgo que se deve fazer uso dela com parcimônia,