CAPÍTULO XIV Cara. Inhame. Camaranbaya. Anônimo. Quingombo. C A R A (termo indígena). Inhame de S. Thome, Quiquoaquicongo (termo do Congo). É uma planta de caule quadrado, penado * (piloso) nos ângulos, verde, mas avermelhado de um e outro lado, um pouco torcido. Este caule se alastra pela terra ou então sobe pelas sebes e se propaga tão largamente, que um só pé é capaz de ocupar uma área de uma horta, tendo de cada lado dez varas de comprimento. O caule e seus galhos tocando a terra aqui e ali, deitam para fora fibras e lançam outras raízes: se por acaso não podem atingir a terra, ainda assim deitam raízes, mas estas por falta de nutrição não podem chegar ao justo tamanho, de maneira que a natureza se mostra luxuriante, na propagação desta planta. No caule, com interstícios de sete, oito ou nove dedos, nascem dois pedículos justapostos, do comprimento de cinco ou seis dedos, quadrados e penados, (pilosos) nos quais se inserem as folhas, tendo figura sagitada, como de nossa seta ou relha de arado, posteriormente circinada. Estas folhas medem de comprimento nove a dez dedos e seis, na sua maior largura; têm um verde alegre luzidio; são sólidas, tendo sete a nove nervos, que procedem da inserção do pedículo e correm, no sentido longitudinal, sendo proeminentes, na parte inferior, e profundamente enterrados, na superior; na extremidade são acuminadas, de acúmen mole, de um dedo de comprido, saliente como na relha do arado. O caule quando incisado deita copioso líquido aquoso, como as lágrimas da videira. A raiz tem mais de um pé de grossura e oito, nove, doze ou mais dedos de comprimento, coberta de uma cutícula cinzenta escura, debaixo da qual prevalece a cor vermelha; por dentro possui uma polpa branca suculenta e quase leitosa. Nasceu-me uma raiz, no jardim, no ano de 1640, tendo o tamanho do jarro dos alemães; os portugueses denominam bottinam.* Esta raiz cozida com manteiga ou óleo e condimentada com pimenta tem bom sabor; seca se assemelha à farinha, por isso é usada como pão pelos habitantes de Guiné. Tive no meu museu dessas raízes apensas à parede, começando a germinar, as quais, a XXI de novembro de 1640, lancei à terra e então tomaram feliz incremento. Eis a planta, que começara a germinar da raiz, plantada por mim, em janeiro de 1640 e que se propagava, em junho do mesmo ano; na extremidade de um caule mais antigo produzia muitas espigas às quais aderiam em cima muitos corpúsculos triangulares, turbinados; estas espigas tinham botões (rudimenta) de uma
História natural do Brasil.
Escrito por Marcgrave, Jorge e publicado por Museu paulista. Imprensa Oficial do Estado