História ou Annaes dos feitos da Companhia Privilegiada das Indias Occidentaes desde o seu começo até o fim do anno de 1636.Vol. 30

Escrito por de Laet, Joannes e publicado por Officinas Graphicas da Bibliotheca Nacional

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Espanha e seus súditos, nas vastas, desertas, e riquíssimas terras da América e África, e principalmente na afamada província do Brasil, onde a Companhia acabou por fazer assento, substituindo-se aos seus inimigos; e não nos envolveremos com o tráfico e a navegação, que ela tem, desde o seu começo, promovido para as terras auríferas de Guiné, ambos os continentes da América, e ilhas ainda não conquistadas e ocupadas pelo inimigo, a não ser de passagem, e quando o comércio estiver ligado à guerra.Esforçar-nos-emos por só escrever a verdade, e não calaremos de indústria o que soubermos que o é. Contaremos singelamente as ações e omissões daqueles que estiveram ao serviço da Companhia, para que os leitores ajuízem deles, conforme o real merecimento de suas pessoas; o que porém com tanta mais descrição devem fazer, quanto nem sempre se deve carregar àqueles, que tiveram parte nos acontecimentos, e malogro da empresa, assim como sucede, pelo contrário, que o bom êxito de outras independe inteiramente da habilidade ou do valor dos homens. Em casos tais cumpre levantarmos os olhos para o céu, e louvarmos aquela Divina Providência, que se tem maravilhosamente revelado em todos os nossos negócios, ora obstando cometimentos, que pareciam sabiamente combinados, ora tirando a bom fim outros, de que cousa alguma se esperava. A Deus somente é devida a principal honra, a ele que foi propício às armas da Companhia, e abençoou os seus minguados recursos, permitindo-lhe reparar os passados danos com prósperos e novos casos, e, contra o juízo e a expectação de todos, fazer grandes cousas em proveito deste Estado com pequenos meios.Para isto, com o seu patrocínio e suas mercês, também contribuíram muito S. A. Potências; e houvesse Deus permitido que se instituísse esta Companhia, não em uma época, em que os dinheiros públicos se achavam distribuídos com uma guerra quase que em nossas fronteiras, com contribuições e socorros concedidos a amigos e aliados, mas em uma época em que ela pudesse ser melhor dotada e mais eficazmente auxiliada, quem sabe que outras empresas de maior alcance não se houveram planejado e efetuado?O Príncipe Maurício de gloriosa memória (para quem foi motivo de júbilo a instituição da Companhia, e o ver, antes de deixar o mundo, os seus primeiros trabalhos), e S. Alteza o atual Príncipe de Orange, com os seus bons conselhos, incitamentos e favores, foram também parte para aquele resultado.Os heróis, que com esforço e felicidade puseram por obra a empresa, acharão, nos devidos lugares, mencionados os seus nomes, e honrados com louvores os seus feitos.Finalmente os vindouros, quando já se não fizerem ouvir a inveja e a malevolência, hão de julgar e reconhecer que a Companhia grandes cousas fez a bem do Estado, e talvez mais do que dela se esperara, ou se podia requerer; pois, se considerarmos os seus haveres obtidos dos próprios membros, e os compararmos com o colossal poder do rei de Espanha, com o qual ela, sem ter respeito a sua fraqueza, sem medir as suas forças, ousou corajosamente arcar, veremos que os seus recursos, os seus meios de ação não são dignos de menção.