Espanha e seus súditos, nas vastas, desertas, e riquíssimas terras da América e África, e principalmente na afamada província do Brasil, onde a Companhia acabou por fazer assento, substituindo-se aos seus inimigos; e não nos envolveremos com o tráfico e a navegação, que ela tem, desde o seu começo, promovido para as terras auríferas de Guiné, ambos os continentes da América, e ilhas ainda não conquistadas e ocupadas pelo inimigo, a não ser de passagem, e quando o comércio estiver ligado à guerra.Esforçar-nos-emos por só escrever a verdade, e não calaremos de indústria o que soubermos que o é. Contaremos singelamente as ações e omissões daqueles que estiveram ao serviço da Companhia, para que os leitores ajuízem deles, conforme o real merecimento de suas pessoas; o que porém com tanta mais descrição devem fazer, quanto nem sempre se deve carregar àqueles, que tiveram parte nos acontecimentos, e malogro da empresa, assim como sucede, pelo contrário, que o bom êxito de outras independe inteiramente da habilidade ou do valor dos homens. Em casos tais cumpre levantarmos os olhos para o céu, e louvarmos aquela Divina Providência, que se tem maravilhosamente revelado em todos os nossos negócios, ora obstando cometimentos, que pareciam sabiamente combinados, ora tirando a bom fim outros, de que cousa alguma se esperava. A Deus somente é devida a principal honra, a ele que foi propício às armas da Companhia, e abençoou os seus minguados recursos, permitindo-lhe reparar os passados danos com prósperos e novos casos, e, contra o juízo e a expectação de todos, fazer grandes cousas em proveito deste Estado com pequenos meios.Para isto, com o seu patrocínio e suas mercês, também contribuíram muito S. A. Potências; e houvesse Deus permitido que se instituísse esta Companhia, não em uma época, em que os dinheiros públicos se achavam distribuídos com uma guerra quase que em nossas fronteiras, com contribuições e socorros concedidos a amigos e aliados, mas em uma época em que ela pudesse ser melhor dotada e mais eficazmente auxiliada, quem sabe que outras empresas de maior alcance não se houveram planejado e efetuado?O Príncipe Maurício de gloriosa memória (para quem foi motivo de júbilo a instituição da Companhia, e o ver, antes de deixar o mundo, os seus primeiros trabalhos), e S. Alteza o atual Príncipe de Orange, com os seus bons conselhos, incitamentos e favores, foram também parte para aquele resultado.Os heróis, que com esforço e felicidade puseram por obra a empresa, acharão, nos devidos lugares, mencionados os seus nomes, e honrados com louvores os seus feitos.Finalmente os vindouros, quando já se não fizerem ouvir a inveja e a malevolência, hão de julgar e reconhecer que a Companhia grandes cousas fez a bem do Estado, e talvez mais do que dela se esperara, ou se podia requerer; pois, se considerarmos os seus haveres obtidos dos próprios membros, e os compararmos com o colossal poder do rei de Espanha, com o qual ela, sem ter respeito a sua fraqueza, sem medir as suas forças, ousou corajosamente arcar, veremos que os seus recursos, os seus meios de ação não são dignos de menção.
História ou Annaes dos feitos da Companhia Privilegiada das Indias Occidentaes desde o seu começo até o fim do anno de 1636.Vol. 30
Escrito por de Laet, Joannes e publicado por Officinas Graphicas da Bibliotheca Nacional